Fiquem vocês sabendo que, muito mais cedo que tarde, abrir-se-ão de novo as grandes alamedas por onde passe o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

(Últimas declarações de Salvador Allende ao povo chileno a 11 de Setembro de 1973, quando os aviões dos generais fascistas já bombardeavam o Palácio de La Moneda)

5 de dezembro de 2017

Maçonaria, Gestão e a Loja – reflexões


Transcrito, com a devida vénia e respectiva autorização, do Blogue Jakim&Boaz
I – Introdução
 Após alguns trabalhos apresentados neste Blog envolvendo temas relativos aos conceitos básicos de gestão duma loja maçónica e à sua eventual correlação com alguns pressupostos e práticas de  Liderança e Gestão das organizações profanas,  achámos oportuno  elaborar uma síntese que integrasse as áreas que considerámos importantes daqueles trabalhos,  complementadas com outros pontos que julgámos não terem sido equacionados ou tratados insuficientemente ou sem a relevância necessária.
 Sendo a Loja a célula base de todo o corpo maçónico, actua a nível local sob a jurisdição do Grande Oriente, enquanto garante superior da coordenação obediencial. O seu funcionamento e a sua dinâmica dependem do cumprimentos dos deveres e obrigações acordados pelos Maçons que a constituem, quando da Iniciação,  mas também da capacidade do Quadro da loja em gerir eficazmente os recursos à disposição, em especial o primordial recurso humano,  óbviamente dependente do filtro do processo de selecção. Esta capacidade (ou não)  constitui o determinante principal para a sua afirmação e perspectiva de desenvolvimento, contributo decisivo para a  evolução da Obediência,  sobretudo no espaço geográfico em que se insere.

A Loja Maçónica representa um modelo único no seu género, sendo considerada como uma micro-organização peculiar, já que  possui  apenas IIr∴ iguais em direitos, mas não em deveres.  Todos os  IIr∴,  unidos  pelo  juramento e vinculados pelo segredo maçónico são  solidários entre si.  Estes  princípios   traduzem desde logo uma diferença  inequívoca  face ao  mundo profano,  diferença essa que é superiormente enquadrada pelo facto do comportamento em sessão ser  guiado e codificado pelo ritual.
 Nesta micro-organização peculiar,  os oficiais assumem uma hierarquização  no plano das responsabilidades e o sistema organizativo e de gestão distingue-se pela particularidade de ninguém deter nem o poder temporal  absoluto, nem  o poder espiritual.  Esta “sociedade” só  obtem a soberania e o poder a partir de si mesma. Traduz um modelo único no seu género, comparativamente à generalidade das organizações do mundo profano, nas suas diferentes áreas de actuação.
 Estipula o Regulamento Geral da N:.A:.O:., que para a  eleição a qualquer cargo em loja, é  necessário que o Maçom tenha o grau de Mestre (exceptuando o previsto para o cargo de Secretário). Em especial o Venerável (ponto c) do Artº respectivo)  deverá ter pelo menos 2  anos de experiência neste grau, e estar entre os mais assíduos e conhecedores dos assuntos maçónicos,  sendo omisso quanto ao prévio desempenho de outros cargos em Loja.

 Este é um ponto a que se deverá sempre dar particular relevo. Não é, à partida, aconselhável escolher para V:.M:. alguém que não tenha tido experiência prévia no desempenho de alguns cargos em Loja, nomeadamente os de:  Mestre de Cerimónias, Experto, Secretário,  Vigilantes ou Orador, o que na generalidade é respeitado.  Sendo certo que todos os cargos são igualmente importantes, as Luzes da Loja (VVigs e V:.M:.), por serem os que mais exigem conhecimento e preparação, deverão ser preenchidos, salvo em casos excepcionais (formação recente da Loja, fracturas ou  dissenções internas), por Mestres com reconhecida experiência  e conhecimento para tal.
 Em termos de suporte a um melhor desempenho das Luzes da Loja poder-se-á questionar a necessidade destes possuírem alguns conhecimentos e sobretudo experiência anterior, na área da gestão de organizações profanas. Não cremos que seja absolutamente necessário, mas será provavelmente conveniente,  se aliado a sustentado conhecimento do funcionamento da Obediência e dos princípios maçónicos, aliados à prática ritualística em Loja, tão necessários ao eficaz desempenho daqueles cargos. Procuraremos nos pontos seguintes, clarificar esta afirmação.
II – O Venerável e a Loja

Numa Loja, as capacidades de Liderança (ou não) do VM são determinantes. Por alguma experiência e conhecimento de diversas lojas, facilmente se constata que muitos não conseguem desempenhá-la e outros apesar de possuírem os atributos adequados, não conseguem construir qualquer coisa muito sustentável. Torna-se pois essencial esclarecer o que se entende ser necessário para esta liderança.
Philip Crosby (6) afirma que: “… é, deliberadamente, fazer com que as acções conduzidas por pessoas sejam planeadas, para permitir a realização de um programa de trabalho".  Esta interpretação afigura-se-nos limitada e até insuficiente, já que o planeamento pouco representará, se não for objecto de compreensão e aquisição (o «empowerment») pelos restantes membros da loja, análogamente ao  que é efectuado pelas Organizações empresariais de sucesso, sob pena de ser metodológicamente correcto, mas depois falhar por falta de adesão da base que o devia operacionalizar e sustentar….
Em nosa opinião, julgamos ser aconselhável, não sendo contudo exclusivo, que para o cargo de Veneralato deva existir, a par das capacidades maçónicas requeridas,  alguma capacidade de Liderança, envolvendo algumas características base da Liderança e Gestão das organizações profanas, além de e sobretudo, bastante trabalho. No entanto não é demais relevar que se o principal malhete está nas mãos do Venerável, o trabalho de gestão diz respeito a todo o Quadro da Loja, pelo que que eventuais insuficiências do VM:. podem e devem ser habilmente colmatadas pela presença e sábia actuação dos VVIG:.,  do Orador (ou de ambos), com conhecimento e experiência dos respectivos cargos, cumprindo deste modo e com a mestria requerida, a  sua função de suporte ao Veneralato, .
 Para suportar o peso do primeiro Malhete é necessário, antes de mais, o  despojamento da dependência das limitações e concepções mentais que o candidato possa possuir, o que requer preparação, discernimento e sobretudo sabedoria, atributo essencial a qualquer candidato credível .   Ao ser escolhido para a Liderança da Loja,  por mais tranquilo e experiente que seja, todo o Irmão acabará  por se deparar com alguma(s) situação(es) e sensação(es) que dificilmente imaginaria anteriormente.
 A solenidade da ocupação do trono, a condução da abertura e fecho dos trabalhos, a impaciência dos Irmãos (querendo ajudar), são por vezes factores que acabam por influir na condução e desenrolar dos trabalhos. Contudo é necessário ter sempre presente que o cargo de Venerável, como todos os restantes, é anual, logo temporário. Quaisquer apegos ao cargo, subjacentes a egos pessoais de cariz profano ou envaidecimentos espúrios, são condenáveis devendo ser totalmente censurados pelos restantes Irmãos, tendo em conta o estipulado no Regulamento Geral.
 Para Manuel P. dos Santos (7): “O Venerável é o reflexo da Loja, pelo que durante as sessões, deve ser mais um catalizador de energias e orientá-las, devendo por isso evitar qualquer intervenção que possa criar divisão ou perturbação na Loja. Nas Lojas maçónicas a chefia ou liderança do venerável Mestre mostra-se fundamental para a realização dos trabalhos, execução dos projectos, criação de sinergias e de fraternidade entre Irmãos”. … …  “Na concepção maçónica o Venerável não pode ser autoritário, ou seja, o seu detentor não se autojustifica pelo poder que detém, dado que ele é eleito. Pelo contrário o Venerável é o polo aglutinador das diferenças entre os Irmãos, pelo que deve ter a humildade de se apagar como indivíduo, de modo que a sua opinião não surja como mais uma voz diferente no seio do templo, mas apenas como um espelho ponderado e sensato sobre o qual incidem todas as opiniões dos membros da Loja”.
O Venerável representa o  modelo  organizador / mediador, aglutinador / preceptor, instrumento gerador de frequência, de vibração, porque lhe cabe, em última instância,  manter a união do grupo, a harmonia do todo, o exemplo da conduta maçónica. Deve ter o perfil de um líder agregador (e não redutor) que motive e aglutine (e não divida) os Irmãos, complementado pela dedicação e abnegação à nobre causa Maçónica. Comparativamente podemos detectar substanciais analogias face ao que representam, embora em escala bem mais limitada e noutra envolvente, as funções e desempenho de um líder duma organização profana de sucesso.
 Se possuidor daquelas características, o Venerável Mestre,  promovendo a paz, harmonia e concórdia, decidindo com coragem, risco e juízo, conjugando Liberdade com ordem, Igualdade com respeito e Fraternidade com justiça, muito provavelmente alcançará um inquestionável sucesso na sua Missão.
 Contudo há que ter em atenção que numa ou noutra loja  podem registar-se  evidências, mais ou menos acentuadas,  de apego ao poder. Em consequência do seu passado, o ex-Venerável por vezes não consegue controlar o apego ao cargo, justamente porque não estava preparado (quando exerceu o mandato), para um dia o deixar,  como é caraterística essencial dos regimes democráticos.  Uma  loja maçónica não tem dono, precisamente por ter uma base essencialmente democrática.  O facto de um ex-V:.M:. achar que continua Venerável, reflecte um âmbito mais profundo relativamente à análise do poder nas Lojas e de como ele pode ser manipulado, mas este tipo de dono da loja pode até nem ser o pior entrave para ela, como bem salienta Hercule Spoladore (1):
“o pior ex-venerável é aquele tipo de irmão matreiro, político, de fala mansa, que sorri para todo mundo, abraça a todos três vezes e derrete-se em falsos elogios aos Irmãos do quadro,  procedendo assim porque é uma das suas estratégias para se manter no poder eternamente.  Vale-se de bonecos ou títeres para cobrir uma gestão, que por imposições das constituições das potências maçónicas, não permite reeleger-se mais de uma ou duas vezes. Em seguida volta gloriosamente na próxima. Mas durante a gestão do seu proposto, quem dirigirá a loja de facto, será ele. Não de direito, mas de facto. Tomará todas as decisões e o venerável de plantão cumprirá rigorosamente o que o seu chefe determinar. Geralmente tem o seu grupo, formado por comparsas coniventes, que antecipadamente já decidiu quem será o venerável para os próximos seis ou oito anos, mas sempre voltando após as gestões de seus substitutos arranjados,  ou então apenas preferirá ser o chefe por trás, nos bastidores, mandando em tudo e por muito tempo”.
Estes procedimentos (felizmente uma minoria) contrariam a essência da N:.A::O:., já que a Maçonaria valoriza a Dialética e  a discussão como força de argumentação,  possibilitando que se contrariem ideias, que sejam discutidas em todos os sentidos e que, como resultado,  surja  uma verdadeira síntese de tudo o que foi tratado, em prol da Ordem e da Humanidade. Representa o permanente estímulo da plena igualdade e da liberdade de pensamento entre os seus adeptos, que qualquer maçom, nomeadamente o Venerável, não pode coartar ou impedir.
 Desiludam-se aqueles que pensam que podem construir uma Loja (ou uma organização) baseada  numa líderança omnipresente / prepotente, rodeando-se de «yes-man» obedientes e acríticos que se recusam  ou são incapazes de pensar pelos próprios meios, inutilizando (muitas vezes sem se aperceberem) as àreas de massa cinzenta com que genéticamente foram dotados,  sempre prontos a louvar o Chefe, na esperança dalguma migalha ou vantagem de partilha de poder …
Este comportamento conduz a organizações sem futuro, fomenta o caciquismo e pode estar na génese (quando exercido a nível regional / nacional) de muitas Ditaduras, mesmo que de fachada pseudo-democrática. Representa em si a profanização da Maçonaria, a promoção do seguidismo ou amiguismo acríticos, levando inevitavelmente à agonia de qualquer Loja ou Obediência. Uma mente livre numa loja Livre, tem de ser sempre, prática e objectivo da nossa matriz orientadora.
 A situação do “dono de loja” representa uma das maiores causas do afastamento de muitos dedicados Irmãos, já que nestes casos particulares,  ao exprimirem-se, sem receio e com coragem, em nome da democracia e dos verdadeiros princípios da Ordem, irão necessáriamente colidir com os desígnios dos candidatos a caciques. Como resultado são marcados, perseguidos e descriminados, acabando por determinar a sua saída da Loja e, na maior parte das vezes, também da Obediência. E assim se perdem muitos dos poderiam ser os nossos melhores quadros e adeptos, frequentemente com alguma influência exemplar no mundo profano…
III – Diferenças entre a Gestão Maçónica e a Profana


Nas estruturas empresariais  do mundo profano, o equivalente ao Ven:. é normalmente chamado Presidente. Nem sempre é eleito, embora na maioria dos casos o seja.  Quando o é, sómente  um pequeno círculo de pessoas constitui o “colégio eleitoral”, a Administração (nomeada pelos donos e/ ou accionistas) e não pela empresa inteira (ou num sentido mais lato pelos “stakeholders” – accionistas,  trabalhadores, clientes e fornecedores).  Não   representa pois a unanimidade, para além de que a empresa a que preside está longe de ser uma comunidade de IIr:. que o apoia.  A sua nomeação efectua- se, na maioria dos casos e contráriamente à Loj∴ Maç∴, sem um prazo fixo.
 No entanto, podemos fácilmente constatar (pela análise diária da secção de “Economia” ou  “Empresas” dos jornais especializados), que a "vida útil" de Presidentes é  cada vez mais  curta,   não representando na maioria dos casos, um ciclo que termina naturalmente.  São como os limões que se espremem até dar o sumo pretendido (pelos accionistas....).  Quando não fornecem o sumo pretendido (entendam-se os lucros e as remunerações) são derrubados, e escolhe-se outro limão.  Chegados aqui,  cada Ir:. poderá aprofundar as comparações e tirar,  desde já,  algumas conclusões...
 O Presidente duma empresa dirige a assembleia constituida pelos membros do conselho de administração,  que não é toda a empresa.  Estes dirigem por sua vez as divisões ou as regiões.  Se, no passado, era muitas vezes o fundador, o patriarca, o Presidente actual é a maior parte das vezes um gestor de carreira (em todo o caso quase sempre um “carreirista”). Está investido dum poder  real e, em geral, faz-se valer dele.
 Nem sempre se respeita, mas  não é venerado nem  venerável.  Toma decisões, mas a sabedoria não é sempre o seu primeiro valor. Os seus objectivos são em princípio o lucro e o crescimento da empresa e as mais das vezes  e em primeiro lugar,  o lucro pessoal e o dos que o suportam...., os accionistas e os seus homens de mão. Finalmente, longe de representar sempre a  sua empresa,  age mais como director e  em seguida, imprime a trajectória que pretende à  empresa (normalmente a dos accionistas...), muito mais  do que se deixa imprimir por ela ou sequer pela dos  seus colaboradores e /ou empregados.
 Tem como atributos não o compasso da rigorosa equidade, ou o esquadro da rectidão comportamental, mas  um  salário elevado  e  benefícios em espécie....  Não considera as oposições como necessárias,  fecundas e se por vezes  tenta a conciliação, na maior parte dos casos  esta toma mais a face da confrontação do que da negociação.   Ao malhete do poder temporal, quase nunca associa a  espada da autoridade espiritual e a sua função é mais relacionada com os direitos do que com os deveres.  Por fim,  tem  muitas vezes mais tendência  para enaltecer a sua função, do que considerá-la um fardo. E finalmente,  longe de descer simplesmente de cargo, após ter completado um ciclo, está longe de prosseguir a sua carreira (nem que seja por breve espaço de tempo) como  porteiro (guarda-interno).
 O Director ou o Director Geral  pode ser equiparado, de algum modo,  ao 1º Vigilante.  Sob o seu punho  "dirige os trabalhos", enquanto no Executivo é  o porta-voz do presidente.  Instrui  a  equipa de Direcção e impõe a Lei,  mas está longe de tratar todos por igual, na empresa.
 Um Director de Recursos Humanos ou Chefe de Pessoal poderá ser  comparado ao 2º Vigilante. Supervisiona e organiza a vida da empresa e ocupa-se da introdução dos novos elementos, responsabilizando-se pela formação inicial e contínua dos trabalhadores. Sugere também, à sua própria maneira, não ficar pela  aparência exterior das coisas,  detectando  nos processos da empresa a oportunidade de expansão.
 Quanto ao Secretário, se o compararmos com o Secretário duma Loja,  será talvez  o Secretário-Geral, o que passa para acta todas as orientações  e decisões das reuniões  da empresa e se encarrega de as recordar à equipa dirigente.  É também o mentor de uma certa coesão. Ao equiparar o Grande Oriente com as mais altas instâncias dum grupo ou holding, o círculo estará completo.
 Poderíamos continuar esta lista com as funções do Orador (Conselheiro, Director-adjunto), do Tesoureiro (Director Financeiro), Experto (Assessor Técnico do Conselho de administração) e Mestre de Cerimónias (Assessor e Comunicação e imprensa).
 Contudo  a vocação duma empresa  não é nem filosófica, nem filantrópica, nem  mesmo espiritual ou amigável.  Não é um orgão vocacionado para  o progresso individual ou da humanidade.  A sua missão não é cuidar do aperfeiçoamento moral e intelectual dos seus trabalhalhadores (muitas vezes bem pelo contrário...), dos  seus pensionistas, viúvas, ou ainda menos organizar convívios ou banquetes amigáveis. Por último, o Guarda-Interno  é colocado tão no fundo da escala, que nem sequer é considerado, certamente não tem o estatuto de oficial (do quadro) e muito menos é um  ex-Presidente ...
IV – A Loja Maçónica como escola de Gestão


Não sendo obviamente a Maçonaria uma escola de negócios ou de promoção social (embora possam existir perigosas e erradas confusões a este respeito, na cabeça de um número  crescente de irmãos, que julgam poder utilizar a Augusta Ordem para potenciar aqueles…),  o desenvolvimento individual que o método maçónico propicia, como filosofia de vida e ferramenta de auto-conhecimento, a par das  ferramentas que nos ensina a manejar, constitui auxiliar precioso para melhorar o nosso «desempenho» no mundo profano.
 Ao transpor alguns desenvolvimentos da metodologia maçónica para o mundo profano, e particularmente para a envolvente específica à Gestão, podemos alcançar significativas melhorias na gestão das organizações, tornando-nos mais  eficazes na produtividade das reuniões, na gestão dos conflitos entre pessoas e na realização de melhores encontros de geração de ideias (“brainstorms”)!. Em sentido inverso, quem já possua aqueles conhecimentos e experiência do  mundo profano, ao adicionar e adquirir uma sólida formação maçónica, terá a situação pessoal muito facilitada se vier a desempenhar algum cargo de gestão numa Loja, e em especial o do Veneralato, já que, no que específicamente à gestão diz respeito,  grande parte se aplica (quase por inteiro) à gestão da Loja Maçónica !!!!
 Conforme bem salienta Philippe Benhamou (2) “Se todos estão de acordo numa reunião, não se vai produzir grande coisa. As ideias devem opor-se para gerar ideias maiores”. Um maçom deve ter plena consciência de que se vai contruindo e consolidando, ao longo do seu percurso,  através do saudável atrito com as concepções e «asperezas» dos outros, já que dificilmente poderá existir criatividade sem a saudável tensão entre opostos.
 Do mesmo modo que as grandes empresas  multinacionais enviam os seus talentos a estágios de formação em gestão nas melhores universidades e escolas do mundo, também a direcção duma Loja, em especial as respectivas Luzes – o VM:. e os VVIG:.  devem planear e providenciar que os membros da Loja, em especial os AApr:. e CComp:. frequentem (com os requisitos necessários) diversas Lojas com credenciais maçónicas firmadas, por via de Irmãos de elevado gabarito ético, intelectual e maçónico, para poderem completar a sua formação e sobretudo abrirem horizontes, que por vezes as lacunas e as naturais insuficiências das suas LLoj:. de origem não lhes permitem alcançar. A procura do Conhecimento e da Luz não pode ter limites em Maçonaria.
 A palavra do gestor maçónico tem obviamente maior peso que a do gestor profano,  porque o maçom sabe e calcula quando deve exercê-la.  “Quando sabe que não pode falar várias vezes na Loja, isso exige que resuma o seu pensamento, para distinguir o supérfluo do essencial.  Não se dialoga directamente, então isso limita os conflitos e as relações de poder”, conforme recorda José Gullino (2), ex-grão-mestre do Grande Oriente de França (GODF).
 Sendo a Maçonaria uma Associação filosófica progressista e humanista, no seu seio os gestores que exercem cargos profanos têm plena  oportunidade de aprofundar e melhorar aquelas características, transportando para o mundo exterior algumas das premissas e comportamentos essenciais da Maçonaria, levando para as Empresas que gerem, um rosto e uma gestão humana e solidária,  por contraposição aos excessos do neo-liberalismo vigente, que trata o trabalhador humano pelo mesmo prisma dum robot, descartável à menor falha de  produtividade.
 Como correctamente afirma um empresário e maçom francês (2), “é necessário tentar sempre saber  como dar uma oportunidade a uma pessoa desempregada há vários anos, mesmo se for preciso levar mais tempo para integrá-la! É necessário tirar o chapéu de empregador para ouvir o sofrimento dos outros. É importante ir além do contrato de trabalho, para compreender as dificuldades dum colaborador. Mesmo quando o colaborador em questão seja rejeitado pelo conjunto da comunidade de trabalho”.
Genéricamente,  na vida profissional, para ganhar eficácia, devem-se seguir determinados rituais. Ora, isto é o que a Maçonaria preenche perfeitamente! As sessões de loja  obedecem aos rituais de abertura e fecho,  com o objectivo de criar um espaço-tempo diferente… Trabalha-se em loja “do meio-dia à meia-noite”… mesmo que a sessão / reunião não dure mais que três horas no tempo “profano”!. Estes rituais são perfeitamente transponíveis para o mundo do trabalho, por exemplo na organização duma reunião de gestão ou de projecto, ou até duma assembleia de accionistas.
 Conforme releva Philippe Benhamou (2): “As reuniões maçónicas chamadas “sessões de loja”, ensinam o valor da palavra”, já que cada vez que pedimos a palavra, ocorre uma triangulação.  Para falar, é preciso pedir a palavra a um vigilante, que a solicita ao Venerável, que responderá ao vigilante se a concede… ou não! “Imaginem reuniões de trabalho onde se possa fazer uso do palavra apenas uma vez! Imaginem as consequências sobre a qualidade da palavra ou a escolha da sua intervenção”.
Escola de ponderação, a Maçonaria convida a ver pelo menos dois aspectos de cada coisa. “É verdade, gostamos de procurar um terceiro termo para evitar o confronto”, salienta Marc-Henry (2), grão-mestre da Grande Loja da França. Um maçom não corta a palavra a um Irmão, tem um comportamento ético, não coloca o tempo todo o seu seu umbigo à frente. “Ele escuta os pontos de vista e tenta fazer alguma outra coisa: ele constrói”.  Um Irmão não gosta de oposições binárias, ele procurará uma terceira via para avançar. Não é de admirar que o triângulo seja um dos símbolos maçónicos!
 Aprendemos a não nos deixar vencer pelas emoções, a manter o autocontrole, a arte de escutar, a capacidade de gerir os opostos e construir(-se) … Todas essas ferramentas maçónicas não são tão misteriosas. “Mas, não há qualquer segredo em maçonaria! O único segredo é a sua experiência”, afirma Marc-Henry (2)  sorrindo. Palavra de grão-mestre!
 V – Concluindo

A Maçonaria tem evidentemente que renovar seus líderes e quadros, para que após 300 anos de existência, com períodos de enorme expansão e outros de igual retracção, mais ou menos directamente proporcionais ao comportamento e evolução da sociedade envolvente, se adapte a novas ideias, novos postulados, novos rumos e até novos paradigmas, sem todavia perder o essencial da sua componente, o método iniciático.  Como em todo o organismo vivo, estas necessidades apresentam todavia riscos e ameaças, os maiores das quais são a  selecção e preparação do capital humano envolvido e o perigo duma eventual descaracterização.
 Neste enquadramento, a escolha do lugar mais desafiador duma Loja, o Venerável, quer das restantes luzes da Loja, reveste-se de especiais cuidados, pois para que um Irmão seja eleito deverá exigir-se,  a par das necessárias qualidades pessoais,  um profundo conhecimento maçónico nos seus diversos segmentos, ritualística, simbologia,  história da Ordem,  gestão, legislação e justiça, tudo isso adicionalmente associado à sua capacidade de liderança. Hercule Spoladore (1) salienta que costuma afirmar-se: “que se você quer conhecer uma maçom? Dê-lhe poder! “.
Ao salientar as especificidades do método maçónico, procurámos evidenciar a utilidade de algumas das suas componentes para possibilitar uma melhor Gestão a nível das organizações profanas,   pesem embora as substanciais diferenças e objectivos entre ambas.
 Em sentido inverso tentámos salientar que o conhecimento e prática da Liderança e Gestão organizacional profana pode, para os maçons,  ser facilitadora do desempenho de funções no Quadro da Loja, em especial do V:.M:.. , tão necessárias a uma gestão prospectiva da loja.
 Lançado o desafio, que cada um de nós se interrogue,  sobre o que aqui e agora se acabou de expor.

Salvador Allen:.  M:. M..

 Bibliografia:
1) –  Spoladore, Hercule -“O ex-Venerável – Dono da Loja”   (“JBNews” – nº 2249)
2) –  Gless, Etienne - “Algumas Práticas de Gestão Inspiradas na Maçonaria”  (“JBNews – nº 856)
3) –  Spoladore, Hercule - “Repensando a Maçonaria”   (“JBNews” – nº 1739)
4) –  Berésniak, Daniel - “ Los Oficios y Los Oficiales de La Logia”
5) –  Allen:., Salvador - “O que se espera de cada Maçom”   (Blog “Jakim e Boaz” – Jun.2016)
6) –  Allen:., Salvador  - “A Loja Maçónica como modelo Organizativo Peculiar”   (Blog “Jakim e Boaz” – Dez.2014)
7) – “Dicionário da Antiga e Moderna Maçonaria” – Manuel Pinto dos Santos – Lisboa, 2012

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