Fiquem vocês sabendo que, muito mais cedo que tarde, abrir-se-ão de novo as grandes alamedas por onde passe o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

(Últimas declarações de Salvador Allende ao povo chileno a 11 de Setembro de 1973, quando os aviões dos generais fascistas já bombardeavam o Palácio de La Moneda)

8 de agosto de 2020

Os Desafios da Tecnologia, o Covid_19 e a Dignidade Humana

 

Os Desafios da Tecnologia, o Covid_19 e a Dignidade Humana

I – Os desafios da Tecnologia

.1 - Síntese  das últimas Evoluções Tecnológicas

Efectuando uma breve análise aproximada dos  últimos 3 séculos, tempo de vida «oficial da Maçonaria Especulativa,  verificamos a curiosa coincidência,  ou talvez não (se recordarmos alguns dos objectivos técnico-filosóficos que vieram a desenvolver-se com o contributo directo e indirecto da «Royal Society»….), de que a Humanidade registou três importantes «Revoluções industriais», que vieram alterar mais ou menos profundamente as estruturas e os modelos sociais vigentes à época, nos diversos países, principalmente  naqueles onde surgiu,  e posteriormente  nos que as vieram a adoptar.

A primeira ocorreu entre 1760 e 1840 e foi precisamente a invenção da máquina  a vapor  (o que nos recorda os primeiros teares mecânicos em Inglaterra,  os primeiros comboios, entre outros). Por volta de finais do Seculo XIX iniciou-se a Segunda Revolução Industrial,  impulsionada pelo surgimento da electricidade e mais tarde do motor eléctrico, dando início à chamada massificação da produção e da iluminação eléctrica.

Com esta última conseguiu-se um enorme  aumento da produtividade, potenciada pela nova organização taylorista.  A electricidade, o motor eléctrico e o motor de combustão (automóvel) tornaram-se as estrelas fluorescentes da época, a que veio juntar-se o avião. Era o admirável  mundo novo, em que assentaram as primeiras décadas do século XX, apenas ensombradas pela 1ª e 2ª Guerras Mundiais:

A «Terceira Revolução Industrial» (que muitos consideram continuar ainda actualmente), começou na década de 1960, com a descoberta do transistor e da denominada «tecnologia do estado sólido», seguida da  rápida e sucessiva miniaturização de componentes electrónicos. Em consequência, surgiram os primeiros circuitos impressos, e mais tarde os «chips», possibilitando (com outros componentes) o «nascimento» do novo e grande Computador («mainframe»),  de controlo centralizado (normalmente característico das grandes empresas, centros de investigação e universidades).

Mais tarde, na década de 1970-80, surge em cena o célebre computador pessoal, a que posteriormente a Apple e a IBM deram  grande impulso, tendo esta última criado (sem o ter percebido inicialmente) uma nova e poderosa indústria de SW (Sistemas Operativos e aplicativos), de que a Microsoft (e outros) foram os grandes beneficiários.

Esta é  também denominada  «Revolução do computador» ou «Revolução Digital», de cuja rápida evolução  ainda estamos a sofrer as consequências, fortemente potenciada na década de 1990, pelo  desenvolvimento da Internet, que registou, a nível global, uma expansão acelerada. Computador que, após consecutivos acréscimos de capacidade e processamento (a lei de Moore tem sido cumprida…), agora todos utilizamos como ferramenta essencial multi-uso, quer no trabalho quer em casa.

.2 – A Globalização resultante da 3ª Revolução Industrial

Entretanto como evoluiu a  tecnologia?.  Acelerou  a «Neo-Globalização», com as substanciais alterações políticas resultantes da queda do império soviético, de que o muro de Berlim foi o «ex-libris», e assim chegámos ao início do seculo XXI.

Confirmou-se que no final de 2016, os utilizadores dos diferentes serviços da Internet totalizaram o dobro de 2010 (ou seja 4 000  milhões) [11]  , equivalendo a cerca de 50% da população mundial ou seja,  10 vezes mais do que em  2000, ou duzentas e cinquenta vezes mais do que em  1995,  apesar dos vários países e regiões ainda substancialmente  afectados  pelo atraso tecnológico, resultante da falta de recursos.

Manuel Castells [1] afirmou «visionáriamente» no princípio deste século: «A Internet é o tecido das nossas vidas. Se as tecnologias de informação são o equivalente histórico do que foi a electricidade na era industrial, poderíamos comparar a Internet com a rede eléctrica e o motor eléctrico, dada a sua capacidade para distribuir o poder da informação por todos os âmbitos da sociedade humana. Tal como as novas tecnologias de geração e distribuição de energia permitiram que as fábricas e as grandes empresas se estabelecessem como as bases organizacionais da sociedade industrial, a Internet constitui actualmente a base tecnológica da forma organizacional que caracteriza a era da informação: a Rede».

Thomas Friedman [12] com uma  abordagem pragmática para a globalização,  caracteriza-a como “a inexorável integração dos mercados, estados-nações e tecnologias a um nível nunca antes atingido, com a consequência de permitir aos indivíduos, empresas e estados-nações estender a própria acção por todo o mundo,  mais rápida e profundamente e com menor custo do que alguma vez foi possível anteriormente”.

Quais as consequências da globalização? Segundo o conceito do conhecido sociólogo (polaco), entretanto falecido,   Zygmunt Bauman [12] “a globalização é  a desvalorização da ordem enquanto tal”, já que pode ser considerada como subversão dos territórios por obra do mercantilismo, dividindo mais do que une,  já que cria uma diversidade cada vez maior entre quem possui («the haves») e quem nada tem («the have-nots»)". Este é justamente o problema de fundo - o acréscimo das desigualdades -  que ninguém, até ao momento, tem querido ou podido resolver, (políticos, gestores, responsáveis e mentores da globalização), por serem parte integrante ou dependentes dos interesses  globais em jogo, ou incapazes ou incompetentes para tal.

Contudo em três décadas integraram-se cerca de 900 milhões de trabalhadores pobres no mundo laboral, constituindo uma nova classe média (sobretudo à custa da China e Índia, e de outros países em desenvolvimento), via deslocalizações fabris originadas nos países mais desenvolvidos, para os de mão-de-obra muito mais barata. No entanto e resultante das muitas deslocalizações, nos países mais desenvolvidos, o diferencial dos rendimentos entre o capital e o trabalho, tem vindo  progressivamente  a aumentar,  agravado pelo desemprego provocado pelas sucessivas crises financeiras das últimas décadas. Como consequência  tem vindo a crescer o contingente mundial dos desempregados e /ou dos excluídos da «globalização» e, o que é mais preocupante,  a sua captura politica maioritária pelos partidos  extremistas de direita, na Europa e América do Norte.

Esta  situação  é  dificilmente conciliável com os princípios que enquanto MMaç:. jurámos defender, no caminho para uma sociedade mais harmoniosa, equilibrada e justa, em pleno respeito pelos valores democráticos, pelos Direitos Sociais e pelo Humanismo, ou seja, pela Igualdade, Liberdade e Fraternidade, que representarão sempre  o nosso padrão referencial.

.3 – A 4ª Revolução Industrial 

.a)  - A Tecnologia e as suas consequências 

No Séc. XXI tem-se expandido largamente a Internet, beneficiando de novas tecnologias e novos Centros de Dados, interligados pelas novas auto-estradas digitais em Fibra óptica, que por sua vez se conecaram com as novas Redes de F.O. locais (até casa dos clientes), acabando de vez com a tradicional rede de telecomunicações suportada nos velhos cabos de cobre. A inovação e as velocidades de crescimento e de transmissão, constituíram o motor e alavanca da revolução já iniciada, potenciando a globalização extrema,  ou como referem alguns sociólogos, o  inicio do desaparecimento da «sociedade analógica» (aquela em que nascemos e fomos criados) e a sua progressiva substituição pela «sociedade digital».

De forma continuada, mas ainda não visível por muitos, tem-se dado início à  «4ª Revolução Industrial»,  onde sobressai  o papel crescente e universal das novas Redes Sociais, apoiadas em potentes Bases de Dados, geridas por novos e cada vez mais sofisticados algoritmos, baseados na Inteligência Artificial (I.A.). As aplicações e utilitários (mesmo a nível empresarial), «voaram» para a «nuvem», os dispositivos móveis  - «smartphones» - vulgarizaram-se,  apresentando muito maior capacidade de processamento e facilidades do que a maior parte dos PCs que temos em casa.  Enfim, estamos práticamente quase todos «em Rede» e na «Nuvem» (excepto talvez em algumas regiões de África e em menor parte,  na América Latina).

Por outro lado, os níveis de potência e performance atingidos pela Internet  e a ligação de tudo isto à «nuvem» (via potentes redes de Fibra óptica)   estão também na base da enorme transformação operacional e de qualidade, registada na estrutura produtiva industrial (por exemplo, na indústria automobilística, entre muitas outras, com a massiva  introdução de robots, controlados por computadores, programados por humanos. Libertou-se assim totalmente, a capacidade humana atribuída até então a grande parte das tarefas mais «pesadas» (pintura, soldadura, transporte e motores, portas e peças, etc,),  tendo um papel fulcral na cadeia de montagem, ela própria também já controlada por algoritmia parcial ou totalmente gerida pela I.A.

Actualmente, e mais ainda no futuro, a «nuvem» («Cloud Computing») representa o novo paradigma de suporte da «Sociedade em Rede».  O preço compensa o risco, a «nuvem» assume o mesmo….mas quantos  técnicos e quadros qualificados foram parar ao desemprego,  por esta enorme diminuição de custos e exponencial aumento de rentabilidade, com a brutal queda dos custos de armazenamento por GB?.

Todo este enorme aumento de capacidades em suportes  digitais potencia também fortemente riscos de acessos indevidos, o que tem feito crescer exponencialmente em todo o mundo o papel assumido pela Ciber-Segurança, em todas as Redes e Centros de Dados, sobretudo nas mais protegidas / encriptadas, de exclusiva utilização militar, mas também nas restantes, de utilização pública global.

Segundo Erik Brynjolfsson e  Andrew McAfee - «The Second Machine Age» [2] esta é a «segunda era da máquina e  ao viabilizar fábricas inteligentes, a 4ª Revolução Industrial cria um mundo novo, onde os sistemas de fabrico físicos e virtuais cooperam uns com os outros de uma forma global e flexível, o que permitirá a total personalização de produtos e a criação de novos modelos operacionais».

Outro importante aspecto a realçar é que a nova revolução não se restringe apenas a máquinas e sistemas inteligentes interconectados, mas simultaneamente a novas áreas, que vão desde a nanotecnologia, ao sequenciamento genético, às energias renováveis, à biotecnologia ou à computação quântica, começando pelo controlo remoto dos equipamentos electrónicos caseiros (a  chamada «Internet das Coisas» ou «IoT» (em inglês). O que a torna deveras distinta das revoluções anteriores é a interação entre os domínios físico, digital  e biológico, possibilitando a integração e fusão destas tecnologias a estes domínios.

Contráriamente às revoluções tecnológicas anteriores, actualmente  as inovações generalizam-se e difundem-se muito mais rapidamente ( a Internet expandiu-se mundialmente em menos de uma década… (mais de 12 vezes mais rápido que o tear mecânico, da 1ª Revolução Industrial…)

Brynjolfsson e McAfee [2] salientam ainda que: «os computadores são tão hábeis que é virtualmente impossível prever que aplicações poderão ter daqui a alguns anos. A inteligência Artificial (I.A.) está á nossa volta em automóveis sem condutores, drones, assistentes virtuais, softwares de tradução, etc,.. e estes factos estão e irão transformar a nossa vida».  

A «4ª Revolução» trará grandes benefícios (temos também SWs utilizados para descobrir novos medicamentos, até algoritmos cada vez mais inteligentes que prevêem os nossos interesses culturais, gastronómicos, profissionais, de tempo livre, etc.) , mas igualmente enormes ameaças e desafios. Entre estes últimos prevemos o exacerbar das desigualdades, já tão evidentes nas sociedades actuais , com a prevista eliminação (por automatização)  de muitos postos de trabalho e um «estrangulamento» ainda maior das classes médias.

Estas consequências irão afectar  os nossos padrões de vida e bem-estar actuais, duma forma provavelmente ainda mais disruptiva,  de que apenas prevemos hoje alguns passos,  mas de que ainda não  temos a certeza de como evoluirão e se concretizarão.

Dentro de 6 a 10 anos (ou menos) prevê-se que cerca de 30 a 35% dos carros sejam autónomos, eléctricos e utilizados partilhadamente. Imaginem só o que esta alteração irá representar para os fabricantes de automóveis actuais, petrolíferas, distribuidores,  taxistas, cidades,  condutores, vias de comunicação, nº de veículos existentes, etc… . As denominadas cidades inteligentes serão o espelho perfeito de todas estas inovações. Aparentemente a qualidade de vida de todos os que tenham sucesso e possam vir a residir em cidades inteligentes, melhorará imenso, mas e a dos muitos outros milhões (esmagadora maioria) que ficarem de fora????.

Em termos ecológicos o Ambiente agradece e estas mudanças serão essenciais, face ao desiquilíbrio mundial originado pelo exponencial agravamento da poluição e dos sucessivos atentados ao ambiente (ex: devastação da Amazónia, centrais a carvão, consumo de derivados pretolíferos), que têm provocado cada vez mais graves  alterações climáticas com graves consequências humanitárias.

Stephen Hawking [13] identificou as duas tendências extremas que se podem verificar, quanto à abordagem da Inteligência Artificial (I.A), afirmando que.:   “A inteligência humana é o resultado de gerações de seleção natural daqueles com capacidade de se adaptarem a circunstâncias alteradas. Não devemos recear a mudança. Temos de fazê-la funcionar a nosso favor”…. “O sucesso da criação da IA seria o maior acontecimento da história da humanidade. Infelizmente também poderá ser   último, a menos que  aprendamos como evitar os riscos”, concluindo:

«Quando criámos o  fogo fizemos repetidamente asneira, depois inventámos o extintor. Com tecnologias mais poderosas, como armas nucleares, biologia sintética e Inteligência Artificial forte, devemos planear antecipadamente e apontar para termos as coisas bem feitas à primeira, porque poderá ser a nossa única hipótese. O nosso futuro é uma corrida entre o poder crescente da nossa tecnologia e  a sabedoria com  que a utilizamos. Vamos garantir que a sabedoria vence».

.2) – Que Futuro ?

Baseado num Inquérito elaborado e distribuído pelo FEM (Forum Económico Mundial), em que os inquiridos indicaram a probabilidade, por Inovação Tecnológica,  do que consideraram «Pontos de viragem esperados até 2025», Klaus Schwab [2], resumiu curiosamente algumas perspectivas, que resultaram do inquérito:

Com uma Probabilidade variando entre 91,2% a 45,2%, os inquiridos responderam, por  Inovação Tecnológica,  que existiriam (até 2025), entre outras:

- 10% de pessoas com roupas conectadas à Internet;  - 90% das pessoas c/ armazenamento ilimitado e gratuito (financiado por publicidade);  - 1 bilião de sensores conectados à Internet;  - 10% dos Óculos de Leitura conectados à Internet;  - 80% das pessoas com presença digital na Internet;  -  Produção do primeiro carro impresso em 3D;  -  Primeiro Governo a substituir o Censo por fontes de «Big Data»;  - Primeiro telemóvel implantável e distribuído comercialmente;   - 5% dos produtos de Consumo impressos em 3D;   -  90% das pessoas com smartphone;   - 90% das pessoas com acesso regular à Internet;   - 10% de todos os automóveis em circulação nos EUA serão autónomos;   - 30% das Auditorias a empresas / organizações realizadas por IA;   - Primeira cobrança de impostos por meio de «blockchain»;  -  Mais de 50% do tráfego da Internet dedicado aos equipamentos e dispositivos domésticos («IoT»);   - Globalmente mais viagens / trajectos em meios partilhados, do que em carros particulares;   - Primeira cidade com mais de 50 000 pessoas a não ter semáforos;   - 10% do PIB armazenado pela tecnologia «blockchain».Das perspectivas apontadas pelo inquérito, podemos confirmar que parte dos objectivos  apontados já acontecem hoje, tais como:

 - 40 a 50% de  pessoas c/ armazenamento ilimitado e gratuito (financiado por publicidade);  - Milhares e milhares de sensores ligados à Internet;   -  45 a 55% das pessoas com presença digital na Internet; -   Variadas peças (aviões e carros, entre outros) já impressas em 3D; - 40% a 45% das pessoas com smartphones; -  cerca de 58% das pessoas com acesso regular à Internet; -  Automóveis sem condutor  de diferentes marcas (Google, Uber, Tesla, etc…),  já circulam há pelo menos 2 anos (em teste) – existem já 3 estados nos EUA onde existe regulação para tal; -  Tráfego da Internet já dedicado à «IOT» (Internet das Coisas)

As previsões valem o que valem mas, independentemente dos valores ou percentagens perspectivados, confirmam inequivocamente que a  «4ª Revolução Industrial» já chegou,  veio  para ficar e já está na rua….

Recordamos que há  trezentos anos,  o combate inicial e essencial da Maçonaria era o de convencer a sociedade inteira a respeitar a  igualdade dos seus membros, independentemente da cor da pele, religião, ou origem social. Hoje, e sobretudo no Futuro,  o desafio é o de consciencializar todos de que essa igualdade só se concretiza verdadeiramente se for permitido a cada um desenvolver a sua individualidade, com Liberdade, Igualdade de oportunidades e Humanismo Social, independentemente dos avanços tecnológicos. Destes devemos tirar proveito, sempre de modo consciente e critico. Porque cada um de nós é verdadeiramente único e diferente entre iguais em direitos e deveres. E é essa Diferença na Igualdade que, afinal, constitui a maior riqueza de uma sociedade, que nenhuma revolução Industrial deverá poder destruir.

II – O Covid_19 e os Serviços de Saúde

Esta terrível pandemia que, desde o início do ano,  tem varrido este nosso encantador (mas já tão degradado…) planeta, com maior ou menor intensidade, dependendo dos países em causa, surge-nos  ainda como um imprevisto e assustador acontecimento, que a todos alarmou e  apanhou de surpresa.  As suas  origens e evolução (China – Whuan),  já vinham pelo menos desde Novembro de 2019 (sabemos agora), mas ou não foram logo compreendidas, detectadas  e portanto atacadas com a intensidade e tecnicidade requeridas ou então,  por incúria,  caso ainda mais grave (mesmo sem entrar nas teorias da conspiração…) foram deixadas vários dias em livre propagação, mesmo contra o parecer de alguns médicos e  técnicos de saúde, que inicialmente o detectaram e divulgaram (até jornalistas), mas curiosamente alguns deles entretanto «desapareceram» misteriosamente ou outros foram até, posteriormente,  atingidos mortalmente pela doença.

Só quando os  alarmes já soavam por todo o lado e as  pessoas iam adoecendo e morrendo com intensidade, é que começou, algo desorganizado inicialmente,  o ataque massivo, apesar dos alarmes, e muitas críticas iniciais. Primeira «solução», foram demitidos parte dos responsáveis regionais e locais do Partido Comunista, por negligência (solução que já estamos habituados neste tipo de regimes), mas somente após a taxa de infeção ir em alguns milhares e os mortos em várias dezenas…

Efectivamente parece, pela muita informação que diariamente nos tem chegado (verificar sempre as fontes…), que posteriormente o ataque foi aparentemente  bem sucedido, com base no rigoroso condicionamento, isolamento e «tratamento» dos infectados, construção rápida de hospital específico, desinfeção de casas, ruas e edifícios  e substancial reforço do corpo de profissionais de saúde e equipamentos de protecção, aliados à natural «disciplina» dos chineses (sob o comando centralizado do P.C. Chinês…), que jogou então as « todas as cartas do baralho».  Entretanto já muitas pessoas, ligadas aos negócios / feiras naquela zona,  graças à globalização / deslocalização, posteriormente viajaram da China para as suas origens, com especial incidência para a Europa e sobretudo para o norte de Itália, França, Espanha (Barcelona e Madrid), Alemanha, Estados Unidos  e alguns até para Portugal.

Desde o início do presente Século, já estávamos alertados sobre a probabilidade, que muitos cientistas perspectivaram desde essa altura, do perigo de poder surgir uma nova ameaça viral,  com novos e mais ameaçadores virus, que acrescido ao  desiquilibrio ecológico agudo que temos provocado no Planeta, poderia ter efeitos catastróficos, a nível global.  Nada foi feito, sobretudo  nos países europeus, que pela sua natureza e pelo que ainda felizmente ainda subsiste dos mais ou menos «enfraquecidos» Serviços Nacionais de Saúde, melhor capacidade teriam para o fazer.

Foram efectivamente as politicas de matriz neo-liberal,  prosseguidas pelos estados ocidentais, após os  EUA e Inglaterra (com os mentores Reagan e Tatcher), que os Serviços essenciais que tradicionalmente constituem as colunas que sustentam  o Estado Social, a começar pela Saúde, a Educação,  a Segurança Social e acabar nos Transportes, passaram a ser alvo de fortes desinvestimentos, para entrega directa a parcerias publico-privados (as famosas PPP’s), ou directamente aos privados, sempre a preço de saldo e em nome de redução de custos (do Estado) e de uma melhor gestão….

O objectivo primário foi o de implementar uma política de «Estado mínimo»,  «desnatando» o investimento nos serviços públicos essenciais, enfraquecendo-os e até destruindo alguns,  sob o pretexto de que eram muito custosos para o Estado (leia-se contribuintes) e pouco eficazes, prestando maus serviços,  daí a «enviesada» necessidade de entrega aos privados. A justificação amplamente publicitada de que a gestão privada era muito mais «eficiente» e rentável,  foi o refrão de fundo. Mas os resultados práticos que se vieram a verificar posteriormente, foram bem diferentes….

A enorme subida de desemprego, diminuição de  ordenados, agravamento da subsistência para muitos milhares de pessoas e, após o desmembramento e  privatização, a degradação progressiva de NHC (Serviço Nacional de Saúde Inglês) a privatização dos transportes,  correios, etc,  foi para esses senhores um acto natural de uma «gestão mais eficaz» e uma «diminuição» das despesas do Estado (sempre o velho e sistemático argumento… .  Mas o «privado» só pega no que pode dar substanciais lucros, prestando um mau serviço, ou excluindo quem não tem meios de o pagar, que são de imediato canalizados para as instituições estatais que restam…. . Entretanto pela completa degradação e muita insegurança, ao longo de vários  anos, o transporte ferroviário nos U.K. foi novamente nacionalizado…

Retirando do âmbito do Estado quase todos os Serviços mais lucrativos, nomeadamente os de Saúde e Fundos de Pensões / Segurança Social, encarecendo-os (sob desculpa oposta), e entregando-as às seguradoras e equivalentes, o que já era comum nos EUA (onde cerca de 50 Milhões de pessoas não têm qualquer assistência médica gratuita, já que não têm rendimento para pagar os respectivos seguros (sem os quais não passam da porta de entrada dos hospitais e Unidades de Saúde privados…), chegámos ao momento actual, com pelo menos 456 mil mortos, desde Dezembro de 2019 e 8 milhões e 520 mil casos diagnosticados em todos os países, sendo os Estados Unidos, o Brasil, o Reino Unido e a França, os mais afectados (em mortes), até ao momento. Dos dois primeiros já tínhamos referido a privatização (total ou parcial) dos Serviços de Saúde. Estes tristes resultados não serão «por acaso»…..

III  - E a Dignidade Humana ?

.1 – Com as Revoluções Industriais

Com a 1ª Revolução Industrial, a fome e o desemprego alastraram  nos países europeus mais desenvolvidos. Foi o custo da transição, que como habitual recai sempre sobre os mais pobres.  A progressiva  readaptação social demorou algumas dezenas de anos, com a criação de novos empregos, resultantes da colocação ao serviço de novas fábricas, realidade que acelerou a migração maciça das pessoas do campo para a periferia das novas cidades industriais, que cresceram significativamente, mas  rodeadas de inúmeros «dormitórios» operários, com reduzidas condições de habitabilidade e higiene. Em termos sociais dominantes a Nobreza rentista foi obrigada a ceder o poder à Burguesia capitalista.

Com a 2ª Revolução Industrial e a posterior implementação de enormes cadeias de montagem em série,  de que o «fordismo» foi exemplo típico, temos de realçar que, a par do desemprego gerado, veio a conseguir-se mais tarde,  um aumento significativo dos salários reais, sobretudo no novo ramo automóvel e dos novos serviços especializados associados, com o aumento de consumo correspondente.

Com a 3ª Revolução Industrial, a do Computador e mais tarde do transistor e Computador pessoal, o mesmo aconteceu, mas os desequilíbrios em termos de emprego foram eventualmente menores do que na 1ª ou 2ª,  dado que surgiram mais rapidamente  novas  oportunidades.

É um dado sociológico e histórico que todas as Revoluções tecnológicas desencadeiam  profundos impactos nas Organizações, sociedades  e países,  sobretudo na estrutura empresarial e social, ou seja  na sociedade em geral. Inicialmente destroem-se muitos empregos, sobretudo os baseados na força humana de baixa qualificação, com os custos sociais inerentes. Por outro lado,  também se criam outros, de nova geração, obrigando  a maior grau de aprendizagem e especialização da mão de obra, ou seja e a chamada adaptação à  introdução às novas tecnologias, em geral.

Já há algum tempo (década 70/80, desde o século passado)  que  a China, se tem vindo a tornar a «fábrica do mundo», através da deslocalização das actividades produtivas de muitas multinacionais, inicialmente afectas aos países ocidentais. As deslocalizações trouxeram um aumento exponencial dos lucros, já que para a fabricação do mesmo produto, passaram a utilizar mão-de-obra barata, intensiva e de equivalente baixo valor acrescentado ou, mais tarde,  até mesmo com M.O intensiva e repetitiva já mais tecnológica (telemóveis, televisões, equipamento electrónico, componentes para automóveis e até fábricas destes).

Este foi o resultado da  globalização desregulada do novo super-capitalismo global sem rosto (controlado pelos grandes Fundos de Investimentos («fundos abutres»), exploradores implacáveis,  multinacionais (em especial EUA, Inglaterra,  Alemanha, e outros), que promoveram progressivamente a deslocalização de muita produção própria,  para a Ásia (principalmente China, India, Vietname, Filipinas, etc. ) e América Latina.

Desde então, muitos estudiosos (economistas, gestores, sociólogos, técnicos, etc.) têm alertado para as perspectivas que se estavam a colocar, pois para além de rapidamente colocarem o novo capitalismo de estado do regime chinês com cada vez maior influência global, transformaram a China na segunda maior potência mundial, em quarenta anos,  bem como o perigo, em caso de crises pandémicas de saúde, originados principalmente pelos hábitos de alimentação orientais (recordemos os SARS, MARS e o H1N1), em especial para os países ocidentais, que face ao que expusemos anteriormente, ficaram mais vulneráveis, porque  «esvaziados» de parte significativa da sua antiga «capacidade produtiva sanitária» nacional.

O progressivo grau de dependência dos países mais desenvolvidos, à cada vez mais global China, embora benéfico para os consumidores em geral,  estruturalmente conduziu  (previsivelmente) também a maus resultados, com as crises do supercapitalismo global. Esta previsão comprovou-se (não era precisos ser «bruxo»), com a China  a «engordar»  sistematicamente, ano após ano, com taxas de crescimento anual do PIB sempre à volta dos 5 a 8%, mesmo durante a crise financeira iniciada há 12 anos nos EUA…., com trágica repercussão em diversos países europeus, economicamente mais fracos (por incompetência própria alimentada também por interesses divergentes dentro da U.E., como bem nos recordamos da famigerada «troika» …).

Sendo inegável o desenvolvimento global gerado com Globalização, sobretudo nos últimos trinta anos,  com especial incidência nos ex-países em via de desenvolvimento, acentuou-se contudo o rápido enriquecimento das diferentes elites (financeiras, gestão,  serviços e industriais), nacionais e transnacionais. Nos países ocidentais simultâneamente  agravaram-se as desigualdades e até pauperização de largas franjas da população.

Nos últimos dez  anos, os 1% mais ricos aumentaram a sua fortuna em mais de 50% e os   10% mais ricos em cerca de 30%,  enquanto os 45 a 55º% representando as classes médias, diminuíram ou quando muito mantiveram os seus rendimentos, já que os pobres, continuam pobres ou, pior ainda, cada vez mais pobres.

Face à inexistência de regulação internacional eficaz (implementada mais fácilmente pelo menos no que compete à CE), capaz de bloquear as distorções introduzidas intencionalmente pelos omnipresentes «mercados» (a U. E., fala, mas na prática pouca antecipação e eficácia tem apresentado, ….) , os grandes grupos económico-financeiros e seus mentores, agências de rating,  fundos abutres, multinacionais,  e  demais donos absolutos da Globalização (sem rosto) fazem o que querem, nomeadamente utilizando paraísos fiscais, fugindo aos impostos, entre outros graves processos danosos para as economias dos países em que se situam.

Para isso e progressivamente, foram assumindo o controlo dos meios de comunicação, essenciais à sua estratégia de «uniformização» cognitiva das mentes  das sociedades e dos cidadãos.Construiram conglomerados de «comunicação» multimédia, totalmente manipulados, onde a chamada «liberdade e independência da informação» é simplesmente figura de retórica. O principal objectivo foi o de “padronizar e institucionalizar” uma cultura global fortemente consumista, suportada em níveis progressivos de «aculturação e passividade» das pessoas, condicionantes prévias da absorção dos valores impostos, através de (quase) todos os meios de comunicação e Redes disponíveis (por eles controladas).

O acelerado  acréscimo de desigualdades atingido a nível global, nunca foi imaginado  desde os «dourados anos 50» do século passado.   A comprová-lo está,  entre outros,  o Relatório da OXFAM referente a 2017,  declarando que «A distância entre ricos e pobres chegou  a novos extremos», e que  estudos mais actualizados provam terem-se agravado ainda mais, durante o ano passado.

O insuspeito banco Credit Suisse revelou recentemente que o 1% mais rico da população mundial acumula actualmente mais riqueza que os restantes 78% do mundo.

Está inequivocamente comprovado pela generalidade dos economistas, analistas e estudiosos que se têm debruçado sobre o impacto nas novas tecnologias na sociedade, nas suas distintas vertentes, que os grandes e reais beneficiários da enorme evolução tecnológica, surgida desde final dos nos 80 do século passado, não têm sido os trabalhadores,  mas o Capital, ou seja dos 1% aos 10% mais ricos. 

Segundo Martin Ford [4]: «Nos EUA  e nos países mais desenvolvidos a desigualdade na distribuição da riqueza desceu para níveis que não se viam desde a grande crise de 1929. Os ganhos de produtividade, que nos anos 50 iam para os bolsos dos trabalhadores, são agora retidos, quase inteiramente por empresários, quadros executivos e investidores. A quota-parte do rendimento nacional bruto destinada ao trabalho, em oposição ao capital, parece estar em continua queda livre».

Com a «4ª Revolução Industrial», em curso, a questão premente que se coloca a todas as sociedades,  indústrias,  empresas, trabalhadores, enfim «stackholders» em geral, já não é a de se existirá rotura, mas sim «quando é que ela chegará, que forma terá e como é que me afectará a mim e á minha organização»[2]. Daí ser urgente prepará-la antecipadamente, com o envolvimento de todos os interessados, de forma a atenuar, tanto quanto possível, a disrupção que inevitavelmente trará.

Antevemos  que os problemas mais graves estarão principalmente do lado do trabalho – o mundo do trabalho e a produção, já que nos países mais desenvolvidos e até mesmo na  China, se tem assistido a um declínio algo acentuado da Mão de Obra produtiva, considerada em % do PIB. Esta queda deve-se à baixa do preço dos bens de investimento, consequência da inovação, que força as empresas a substituir progressiva ou rapidamente, o trabalho pelo capital (ou seja o manual  pela automatização / robotização…).

É urgente (ainda mais se juntarmos a componente ecológica)  que a todo o custo, se consiga atenuar, a concentração de riqueza e poder nos cerca de 10% de  privilegiados que têm recolhido quase todos os ganhos de produtividade,  pelo que urge  encontrar, nas sociedades e países, as mais diversas formas de concretizar algum reequilíbrio entre os benefícios e os riscos das plataformas digitais inteligentes (incluindo as industriais e a ecológica), por forma a permitir alguma abertura a situações e oportunidades de inovações da base colaborativa, signifique isto o que vier  significar.

Se a esta frustração já acumulada, por parte do trabalho, for realimentada por  um aumento substancial de desemprego, poderá  levar a graves situações extremas, geradoras de desespero e revolta (saliente-se, entre outras, a dos «coletes amarelos» em França), a maior parte dos quais poderá cair facilmente, pela desagregação verificada nos partidos tradicionais, nas mãos do radicalismo da extrema-direita (veja-se o que tem acontecido na EUA, Europa, Brasil, e outros países…).

Isto pelo simples facto de que passarão a ter  certeza de que o seu rendimento não irá progredir ao longo da vida (antes pelo contrário), mas  sobretudo de que os seus filhos irão ter uma vida pior do que a  deles, enquanto os 10% mais ricos continuarão a ver as suas fortunas aumentar exponencialmente, para  já não referir os «donos disto tudo», os tais pertencentes ao reduzido universo do 1%...

Embora as profissões que exijam menores níveis de aptidão continuem a decrescer, é previsível que um elevado número de «colarinhos brancos», com formação universitária, venha  a descobrir que, também os seus postos de trabalho  venham a estar sob ataque, graças ao rápido avanço da capacidade dos algoritmos cognitivos preditivos e do  SW de automatização que  a I.A. utiliza.

Para além deste  facto, já  deveras preocupante, não conseguimos ainda prever com alguma precisão, o impacto real no mercado de trabalho e na sociedade em geral, estimando-se contudo (dependendo dos países, mas sobretudo nos mais avançados) que entre 30 a 55% dos actuais empregos, possam ser extintos, entre os próximos dez a quinze anos. Outros surgirão, provavelmente mais ou menos especializados mas, por certo, não cobrirão parte significativa daquelas perdas, para já não falar da eventual nova remuneração média….

Tem-se vindo a comprovar que na generalidade das sociedades mais desenvolvidas, os vencimentos dos recém-licenciados tem vindo a diminuir, ao mesmo tempo que quase metade (ou mais, dependente do país em causa) são forçados a aceitar trabalhos que não exigem formação universitária (atente-se p. ex. aos empregos das grandes superfícies comerciais do nosso país…). Nos EUA, e rápidamente nos restantes países mais desenvolvidos, o emprego de muitos profissionais qualificados  já está a sofrer uma erosão com algum significado – jornalistas, advogados, cientistas, farmacêuticos, empregados escritório, taxistas, etc. em virtude do avanço dos novos serviços suportados nas   «tecnologias de informação inteligentes».

Enquanto no passado a automatização tendia a ser mais especializada, atingindo um ou determinados sectores de cada vez, actualmente é totalmente diferente,  já que o impacto da progressiva introdução de algoritmia inteligente irá atingir todos os sectores, uma vez  que quase todas as industrias existentes irão exigir provavelmente menor mão-de-obra intensiva, à medida que o seu negócio for incorporando tecnologia mais inteligente e essa transição já está a ocorrer ou ocorrerá mais rapidamente do que pensávamos. As indústrias emergentes irão incorporar, desde a raiz, poderosas ferramentas robotizadas e inteligentes, traduzindo a    poupança do trabalho humano, num significativo aumento  da produtividade.

A maior parte dos estudiosos e cientistas estão convencidos que os níveis de liderança e compreensão das mudanças em curso são reduzidos, em todos os sectores, se confrontados com a necessidade urgente de repensar todos os nossos sistemas económicos, sociais e políticos, de modo a enfrentar com algum sucesso as ameaças , mas também oportunidades, que a 4ª revolução nos coloca.

Não é por acaso que os grandes inovadores e cérebros da tecnologia actual, como  Stephen Hawking [13], Steve Wozniak, Bill Gates, Elon Musk,  e muitos outros peritos em IA, escreveram uma carta aos principais dirigentes mundiais,  e a todos os que trabalham com IA,  além de realizarem diversas conferências sobre o tema, alertando para os perigos que poderão advir da I.A., se o ser humano lhe perder o controlo…

Diríamos que,  numa visão mais pessimista, podemos estar a libertar da lâmpada de  Aladino, o génio que nos poderá reduzir à menoridade e/ou escravidão…

.2 – Com o  COVID_19 

A crise mundial originada pelo «fecho» de grande parte dos países e regiões («confinamento»), práticamente a nível mundial (com as «especificidades dos EUA e Brasil, entre outros….),  veio ainda agravar fortemente, a curto-médio prazo,  as perspetivas que apontámos anteriormente.   Com o atraso chinês na divulgação da nova epidemia, os estados europeus e alguns asiáticos (porque foram os primeiros), nomeadamente os que tinham mais intercâmbio industrial com a região infectada), foram apanhados completamente desprevenidos  e inicialmente a situação em Itália foi alarmante, seguida pela Espanha, a França e mais tarde  Inglaterra,  para já não falar posteriormente nos EUA e Brasil, dirigidos por extremistas paranoicos, incompetentes  e socialmente criminosos.

Não nos iremos alongar mais neste ponto, porque já muito tem sido visionado, falado e escrito (e «martelado», de manhã à noite, em todos os telejornais dos diversos canais, por cabo ou canal aberto).

Com a actual pandemia alastrando rapidamente a nível mundial, os seres humanos mais humildes ou limitados, têm sido as vítimas fundamentais, sobretudo os de maior idade, com perda de mobilidade ou de maior morbilidade, (no nosso país, a percentagem de mortos relativamente ao total, contempla cerca de 85% maiores de 70 anos, até ao momento). A «razia» em lares, centros de assistência e apoio a pessoas idosas, zonas e bairros problemáticos e marginalizados, vivendo sem condições de habitabilidade e sanitárias mínimas (e que, quando trabalham,  só utilizam os transportes  públicos, para poderem chegar ao  destino), sem-abrigo, etc, foram muito mais severamente afectados pela mortalidade do vírus, pelo que os responsáveis, a todos os níveis, devem tirar as respectivas conclusões.

Os Serviços Públicos (já que os privados ou fizeram «lay-off», ou puseram-se de  lado, nas fases mais críticas…) tiveram de se redimensionar à pressa, com os respectivos profissionais, a serem as principais vítimas iniciais, dado não terem os imprescindíveis equipamentos de proteção mínimos necessários.

O esqueleto fundamental foi, como não poderia deixar de ser, o Serviço Nacional de Saúde - SNS, apesar das muitas dificuldades iniciais (resultantes do desinvestimento, mais ou menos acentuado, de quase todos os últimos governos) e que com a Segurança Social e o Ensino público gratuito, são as peças chave do que resta, para além da Liberdade,  da Defesa da Igualdade e da Dignidade Humana, pontos de honra de Abril.

É pois de louvar a atitude de todos os Profissionais de Saúde, do Serviço Público e de todos os organismos que constituem o SNS, dos Bombeiros e serviços de Emergência, da Protecão Civil e Forças de Segurança, que deram o melhor do seu esforço, em coordenação com o Governo, para que a contenção acontecesse o mais depressa que fosse possível.

Estando actualmente o maior foco na Região de Lisboa e vale do Tejo, há que trabalhar consistentemente para o eliminar, mas com a paragem forçada do(s) pais(es), começa agora a manifestar-se com enorme intensidade o problema financeiro das Famílias,  Empresas e Associações, já que se perspectiva uma crise equivalente aos anos 29 do século passado ou ao fim da 2ª Grande Guerra. É altura, agora, da Europa agir finalmente à altura da gravidade da situação, que ultrapasse as permanentes divergências internas, o que ainda, com algum optimismo, esperemos vir a acontecer, senão poderá desencadear (começando pelo Brexit) a sua própria auto-aniquilação.

Por exemplo, a dificuldade e debilidade de resposta face à enormidade explosiva da pandemia, nalgumas regiões europeias,  chegou a um ponto tal que, em Itália e em Espanha, o pessoal médico teve, em alguns momentos,  de escolher entre quem deixar morrer e os que iriam tentar salvar… o que constitui  um dos mais graves ataques à equidade no tratamento e à  dignidade humana, só equiparável a tempos de guerra em larga escala. 

IV – Em conclusão – Que consequências para o Século XXI ?

Com tanta e tão inovadora  tecnologia sucessivamente disponível para os países mais desenvolvidos, a primeira interrogação que normalmente nos ocorre é a de que como é possível que um simples vírus, que por si só não sobrevive, a não ser que se transmita e hospede num ser vivo mis desenvolvido, neste caso humano, não tenha sido detectado a tempo e combatido eficazmente? Após tão grandes avanços tecnológicos e científicos alcançados pelo ser humano até agora, ainda há muita coisa que  Ciência, a Biologia, a Medicina e Laboratórios especializados  têm para investigar e prever. Mas será sómente  isto?

Sendo  conhecida a mutação e a portabilidade dos vírus, nesta sociedade Super-Globalizada em que os lucros fabulosos são o objectivo último, os Grandes Laboratórios competem loucamente entre si, e por norma só trabalham e investigam principalmente novos  medicamentos para o «mercado mundial» , ou seja na perspectiva que venham a dar enorme lucro, de forma a compensarem (e em grande !!!!) o investimento de investigação e pesquisa efectuado. A esmagadora parte do  esforço é canalizado para a medicina curativa. Convem recordar que os cada vez mais largos milhões de doentes crónicos, devido ao aumento da esperança média de vida ocorrida nos últimos quarenta anos, são um fabuloso e permanente mercado – uma enorme «renda garantida». Assim convem às multinacionais do sector e à industria farmacêutica privada, apostar prioritáriamente na medicina curativa e «atenuar», dentro do possível,  a medicina preventiva, ou seja a Saúde Pública, tal como ela devia prioritáriamente ser encarada (ou seja como diz o povo « vale mais prevenir do que remediar»…).

Se fizermos algumas contas não muito complicadas, fácilmente constatamos que os ditos custos «fabulosos» dum SNS competente e de âmbito estatal,  melhor organizado e apostando mais na  medicina preventiva, ou seja prevendo, evitando, via tratando em tempo útil a doença dos cidadãos, antes que se torne crónica, são inferiores aos da curativa crónica (predominante actualmente). Se comparados com os lucros multimilionários que esta fornece à Industria Farmacêutica e ao que lucram os grandes hospitais privados (nomeadamente com a ADSE e com os casos que o actual  SNS não consegue atender…), nem é conveniente abordar…. (médicos,  economistas e  cientistas de renome,  não alinhados com o «sistema», já fizeram estas contas).

É  agora mais fácil, atendendo ao que atrás referimos, compreender melhor o real e efectivo objectivo das politicas (de diferentes governos), que sustentaram o sub-financiamento crónico do SNS,. Este facto é  aliás comum a nível europeu, como agora com o Covid_19 rápidamente se percebeu, com trágicas consequências…..

Portugal, sendo dos paises europeus que tem das maiores esperanças média de vida, é dos que tem no entanto pior qualidade de vida na velhice, ou seja mais doenças e menos saúde, contráriamente aos países nórdicos e centro-europeus. Este problema sobrecarrega o SNS (mais assistência médica e maior consumo de medicamentos…) e «muito satisfaz» a industria Farmacêutica e a privada hospitalar.

Ou existe coragem para alterar este  problema real de fundo, ou  o SNS será cada vez mais deficitário, dada a perspectiva de maior esperança de vida, mas  com menor saúde, aliada a novos remédios e  novas tecnologias cada vez mais caros….. Este é claramente o cerne do problema,  que politicamente os sucessivos Governos,  em maior ou menor escala, não têm querido ou podido resolver, face às permanentes debilidades económicas e sobretudo aos grandes interesses em jogo (não por acaso, quase sempre presentes em sucessivos governos…).

No entanto é o futuro do país, através dos seus cidadãos, que está em causa!!! É necessário (como em muitos outros casos) uma linha de rumo política maioritária e minimamente estável, que estanque a voracidade dos interesses estabelecidos. O país, ainda mais empobrecido e endividado com a crise do Covid_19,  já não suporta mais este desperdício de recursos e desrespeito pela Saúde dos cidadãos ( e de  enfraquecimento do SNS).

A Maç:. não sendo partido politico ou organização religiosa, tem contudo o dever de lutar por tudo o que colida com a Dignidade Humana, propondo (e até levando à prática, se possível -  como o nosso saudoso past-Grão Mestre, António Arnaut , teve a coragem de fazer, criando o SNS, enquanto Ministro dos Assuntos Sociais), medidas que reduzam as desigualdades e tornem a Sociedade e o País mais Fraternos e Solidários, onde a qualidade de vida e sobretudo assistência na doença ou invalidez, não esteja dependente da cor da pele, idade ou estatuto social. É nesta perspectiva que temos de continuar a trabalhar.

Por outro lado, sendo a Maç:., pela própria natureza uma organização tradicionalista, pela sua dimensão   filosófica, cultural e social,  continuou a viver, na maior parte dos casos, no seus espaços e limites específicos, descuidando e atrasando-se,  até há muito poucos anos (em nossa opinião), face às alterações sociais e organizacionais decorrentes da «revolução» que emergiu a partir da «Sociedade em Rede».

É evidente que, como sempre reafirmaram os Rituais e os clássicos, com que todos concordamos,  que a realização das Sessões só faz sentido se for  presencial e vivida colectivamente,  com base na aprendizagem via transmissão, de que o Ritual constitui o suporte base. Devemos salientar que a actividade das Lojas, neste período da pandemia, apesar da impossibilidade de realização de Sessões físicas conjuntas, se comportou, pelas mais diversas vias,  com a devida solidariedade que tanto nos é querida e característica.

A« necessidade aguça o engenho», como diz o povo e os Irmãos das Lojas não deixaram de comunicar entre eles, quer telefonicamente (no período de confinamento e nos seguintes), quer reunindo-se informalmente através das diversas plataformas de video-conferência  (já produto da 4ª Revolução tecnológica….), pesem embora os problemas de segurança existentes,  devendo as discussões e tratamento de assuntos internos ser evitadas nestas aplicações, (como foi correctamente indicado pelo Sec. Geral e pelo C.O.) pois nunca sabemos quem lhes poderá aceder…., como vários casos foram relatados, noutras áreas, que utilizavam o mesmo SW, devido à actuação dos «hackers»….

Este é um ponto muito  importante, já que a propriedade e gestão das plataformas e Bases de Dados, já com gestão através da I.A., são privadas (e entre outros – leia-se extremistas de direita, fascistas e fundamentalistas religiosos e «hackers»)  estão sempre atentos ao que fazemos (ou prevemos), o que constitui imperativamente uma das principais vulnerabilidades das novas tecnologias, dadas as suas características e especificidades técnicas e do SW de controlo (a que o utilizador comum nem conhece nem pode aceder, se conseguir, para melhor se  proteger).

Inclusivamente o nosso 16º Congresso, inicialmente marcado para o período em que  recaiu o confinamento,  num importante passo de abertura dirigido à sociedade civil,  já realizou nos últimas (no pós-confinamento), duas Teleconferências (substitutas das Conferências presenciais, previstas sobre os temas anunciados),  onde a audiência (em casa) podia colocar perguntas aos conferencistas, por escrito.

Enfim estamos (e bem) a aproveitar a tecnologia para reagir às contrariedades, o que é de relevar e seria impensável há dois ou três anos atrás…..

Sendo óbvio que a nossa vocação não é tecnológica, é (e será cada vez mais) importante que alguns Irmãos mais ligados profissionalmente ou atentos a esta àrea, continuem a prestar a atenção devida ao tema, ajudando a  Instituição a organizar-se melhor  e a publicitar / divulgar a sua «presença» e sobretudo as suas posições, junto à sociedade civil, sempre na vanguarda da defesa dos nossos valores Humanistas essenciais e no respeito pela Dignidade Humana…. tal como sempre defendemos

A  Maçonaria, entre o esquadro e o compasso, tem de encontrar o seu próprio modo de incorporar as novas realidades tecnológicas e as suas consequências sociais, no desenvolvimento da sua actividade, ou não fosse a nobre herdeira da «Royal Society»....   . Sem prescindir dos seus princípios fundamentais, tem de aproveitar a oportunidade para continuar a divulgar e a praticar a sua  mensagem solidária da Liberdade, Igualdade, e Fraternidade. Temos de ter sempre presente que é nossa obrigação,  transmitir  e exprimir a posição da Maçonaria à Sociedade, enquanto tal, sempre que se torne  necessário,  numa perspectiva de colaboração construtiva mas também crítica, se for o caso

Felizmente o panorama da NAO:. , a partir dos dois últimos  anos,  tem estado progressivamente a alterar-se, sendo de relevar algumas iniciativas já programadas pelo C.O., com a nomeação de Comissões Técnicas, em diversas áreas, no âmbito do Conselho Consultivo do G:M., para discussão destes temas, na perspectiva que nos deve dizer respeito.

Quanto ao futuro a médio prazo, um facto é certo: enormes alterações organizacionais e sociais, inevitavelmente irão ocorrer, a todos os níveis,  e do ponto de vista das consequências sociais,  previsivelmente chocarão de frente com os nossos valores referenciais, daí a necessidade de estarmos conscientemente vigilantes, e que pandemias como o Covid_19 só vieram agravar fortemente, porque a extrema globalização a que chegámos, para isso contribui… (como anteriormente já referimos).

Neste momento tão crítico para a Humanidade, os países e regiões (a começar pelos mais poderosos) devem parar para pensar e analisar criticamente os efeitos devastadores da Globalização extrema, para o enorme aumento da desigualdade de rendimentos, da progressiva proletarização das classes médias e dos mais fracos, e também para a destruição ecológica do Planeta, de que os nossos filhos e netos serão as primeiras vítimas.Sendo consequentes, teremos de nos colocar ao lado daqueles que entendem que as injustiças e as desigualdade sociais não podem  agravar-se mais, havendo que proceder a um reequilíbrio e alteração da repartição da riqueza gerada, nomeadamente a  favor do trabalho.

Com a globalização extrema no terreno e adicionalmente o COVID_19 ainda ao ataque…. (e no futuro prováveis e mais graves «sucessores»), há que reduzi-la progressivamente (o que não será imediato, mas de média / larga duração, mesmo que exista entendimento para tal…) .

As Lojas devem, mais do que nunca, continuar a agir como verdadeiros Templos de Transformação,   subsistir e  desenvolver-se se calhar com novos moldes, mas mantendo o essencial, e onde homens e mulheres se preparem para responder, segundo as referências implícitas na nossa matriz fundacional, às rápidas mudanças exigidas pelo mundo actual e futuro. 

Poderão é ter de fazê-lo, futuramente, de forma eventualmente diferente (tirando partido das Redes e novos SWs aplicacionais), como ultimamente temos genericamente efectuado, mas com as devidas protecções e cuidados, dentro do possível…). Convem recordar que o Planeta agradece menos deslocações «diminuindo o nível de CO2 na atmosfera» e isso é inultrapassável. Será preciso um novo Virus (eventualmente ainda mais letal) para tomarmos plena consciência do desastre ambiental que criámos e que urge parar e  regredir, tão urgentemente quanto possível ?

Temos também de continuar a reflectir sériamente e sem preconceitos, mas com seriedade e  responsabilidade, nos quase 52% do universo humano que continuamos a excluir das nossas Lojas, problema já sem justificação credível ou sustentável à luz das leis e princípios humanistas  da segunda década do Século XXI, o que  algumas Obediências de maior peso já resolveram (com algumas  dificuldades e riscos, é um facto…, mas resolveram). A sociedade evoluiu bastante desde o Séc. XVIII e a Maç:. não pode ser estanque a isso… sob pena de prolongarmos uma deriva algo fundamentalista.

Em conclusão e citando o NQIr:. Mário Jorge [9]: “Sendo previsível que a situação que estamos a atravessar com esta pandemia vai deixar mossas, ainda não é possível vislumbrar o que virá depois e em que sentido se fará a sua superação.   

A vida e a história têm mostrado que a Democracia e a Liberdade não são direitos adquiridos e que se não os defendermos continuamente há sempre quem esteja à espreita para os tentar liquidar.  

Desde a II Grande Guerra,  que este é o momento mais preocupante para as democracias. As barrigas vazias conduzem ao desespero e a dar ouvidos a supostos «salvadores».  

Não demoremos a meter mãos à obra. A Democracia e a Liberdade não podem ser mercantilizáveis, tal como a Dignidade Humana”.

Salvador Allende   M:. M:.   

Bibliografia

1) - «A Galáxia Internet – Reflexões sobre a Internet, Negócios e Sociedade» – Manuel Castells  -  F.C.G. Lisboa (2004)

2) - «A Quarta Revolução Industrial» - Klaus Schwab – Levoi Marketing e Conteúdos Multimédia, SA – Lisboa (2017)

3) - "L’Internet est-il Maçonnique ?", Jiri Pragman

4) - «Robôs – a Ameaça de um futuro sem Emprego» - Martin Ford» – Bertrand Editora  - Lisboa (Jul.2016)

5) - «Os Robôs querem o seu Emprego» - John Pugliano – Edições Desassossego – Porto Salvo (Junho 2018)

6) – «Robótica e Trabalho - O Futuro Hoje» - António Brandão Moniz – FLAD (Edições Glaciar) – Lisboa (Março.2018)

7) - «A Riqueza dos Humanos – o Trabalho e  a Ausência dele no Séc. XXI» - Ryan Avent – Editorial Bizâncio (Jan.2018)

8) - «Como será o Futuro e porque depende de nós» - Tim O’Reilly – Publicações D. Quixote – Alfragide (Maio.2018)9) 

9) - « A barriga vazia nunca foi boa conselheira!» - Mário Jorge Neves – Artº publicado no jornal «Público» de 04.Jun.2020.

10) – Revista “Cultura Masònica” Nº 10 -. Editorial Masónica

11) – “A Sociedade em Rede - considerações numa perspectiva maçónica” - Salvador Allen:.  M:.M:. (Blog «Jakim & Boaz)

12) – “Globalização e Desenvolvimento” – Frederico Bonaglia e A.Goldstein – Editorial Presença (Jan.2006)

13) – “Breves respostas às grandes perguntas” – Stephen Hawking – Edições Planeta (6ª Edição – Jan.2019)

14) – “Inteligência Artificial” – Arlindo Oliveira – Fundação Francisco Manuel dos Santos (Jan.2019)

15) – “Salazar e os Fascismos” - Fernando Rosas – Editora «Tinta da China», Lisboa 2019

16) – Internet e jornais actuais (sobre o Covid_19)


Sem comentários:

Enviar um comentário