Fiquem vocês sabendo que, muito mais cedo que tarde, abrir-se-ão de novo as grandes alamedas por onde passe o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

(Últimas declarações de Salvador Allende ao povo chileno a 11 de Setembro de 1973, quando os aviões dos generais fascistas já bombardeavam o Palácio de La Moneda)

11 de outubro de 2015

Origens do Grau de Mestre


Para caracterizarmos o que é, hoje, o terceiro e último grau de instrução das Lojas Azuis deveremos recuar a tempos idos no sentido de melhor esclarecer aquele que é considerado, por um lado o último da instrução básica e por outro o início da Mestria de Si que durará a vida inteira sendo considerado o grau pela qual a F-M recorda, à vez, as Associações Profissionais da Idade Média e os Mistérios da Antiguidade.

Como sabem, este grau e ao contrário do que afirmam muitos historiadores, não existiu sempre na F-M. Cito Findel que no seu livro de 1862 (História da Franco-Maçonaria) afirma: …no princípio, o ritual de recepção formava um todo invisível não havendo senão um grau, logo, o Grau de Mestre não existia naquela altura…
Assim, dividi a exposição em três distintas partes, a saber:

1-      A Mestria na Franco-Maçonaria Profissional ou Operativa.

2-    A Iniciação durante o Período de Transição.

3-     O Terceiro Grau na Franco-Maçonaria Especulativa.

Iniciemos o primeiro item:
A MESTRIA NA F-M PROFISSIONAL OU OPERATIVA 

A F-M deriva das corporações profissionais que praticavam a arte de construir. Era nelas, e sob a organização económica da Idade Média baseada em associações e privilégios, que se aplicavam os conhecimentos necessários ao exercício de cada profissão. Com os seus segredos, que salvaguardavam em Testamentos, estavam divididas em dois graus: os Aprendizes, e quando estes eram considerados aptos para exercer a profissão seriam admitidos nos Companheiros. Nesta altura o Mestre era um título (Magister, Meister, Master) que era atribuído a um Companheiro que tivesse operários sob as suas ordens ou abrindo um atelier por sua conta. Seria equivalente ao que hoje chamamos Patrão.

Ao lado destas associações profissionais um outro género de associações ditas mutualistas, de fraternidade ou caridade normalmente presididas por um Mestre que estaria (por estatuto) em pé de igualdade com os Companheiros. Curioso referir uma parte de uma carta escrita pelo Bispo de Bâle em 1260 que referia explicitamente:…as mesmas condições são aplicáveis aos que não pertencem à profissão mas que desejam entrar nas confrarias de fraternidade…

Mais concretamente, começando por França e de acordo com os Documentos da Época, o corpo profissional apenas continha Aprendizes e Companheiros e só no Séc. XVI aparece o título de Mestre atribuído a qualquer Companheiro que se estabelecesse por conta própria. Na Escócia, segundo os processos-verbais da Loja de Sta. Maria em 1475 os termos Companheiro (Fellowcraft) e Mestre eram equivalentes. Em Inglaterra, as primeiras lojas profissionais remontam ao Séc. XI após a conquista pelos Normandos e segundo os processos-verbais existentes os maçons ingleses dividiam-se em Aprendizes e Companheiros ou Mestres, e mais uma vez estes últimos só obteriam o Título se tivessem trabalhos e ter Aprendizes e Companheiros sob as suas ordens. É importante remarcar o que o chamado manuscrito de Sloane do início do Séc. XVII incita somente o Aprendiz a guardar o segredo da sua arte e a prestar juramento.

Resumindo, na Franco-Maçonaria Operativa a passagem entre Graus era puramente técnica e profissional não havendo lugar a simbolismos filosóficos ou míticos.

Passemos ao item seguinte:
A INICIAÇÃO DURANTE O PERÍODO DE TRANSIÇÃO

A partir do Séc. XVI, primeiro na Escócia e um pouco mais tarde em Inglaterra, uma situação nova se estabeleceu nas Lojas Profissionais pois passaram a estar abertas a pessoas sem relação com a arte de construir. Eram membros honorários, chamados também especulativos, teóricos ou geomânticos (em oposição aos maçons profissionais ditos práticos ou domóticos) que seriam escolhidos entre os grandes proprietários, clero, oficiais das forças armadas e juntando-se, a partir do Séc. XVII, homens de letras, médicos, naturalistas, professores, músicos e etc.; como tão bem descreveu Elias Ashmole na sua Autobiografia. Vale a pena mencionar que numa versão das Old Charges de 1663 estava escrito… a regra é que ninguém pode ser recebido maçom, salvo numa loja que contenha pelo menos cinco maçons dos quais só um pode pertencer à profissão…

Claro que a estes novos maçons não era exigido o tempo normal de aprendizagem e aos profissionais passam-lhes a exigir as formalidades tradicionais do Aprendiz, ou seja, o juramento e a discrição.

Pela leitura dos Documentos Antigos constata-se que a existência dos Aceitos decorre de 1620 a 1678 sugerindo a mesma leitura que as Lojas, não somente admitem especulativos ao lado dos profissionais (dando Títulos de Companheiros ou Mestres), como também começaram a organizar-se ao lado e de fora da esfera profissional.

Em resumo, a F-M Operativa, como revela Mackay na sua História da Maçonaria, …não era tolerante nem cosmopolita apesar de eclesiástica ao princípio, sempre cristã e sempre sectária…, e se há característica que marca a diferença entre a operativa e a especulativa é, exactamente, o sectarismo e a tolerância começando nesta altura a desenhar-se os diferentes rituais de cada uma. 

Finalmente a abordagem do 3º item:

O TERCEIRO GRAU NA MAÇONARIA ESPECULATIVA 

No início deste período, dito Especulativo, não há nem presunção nem probabilidade de um terceiro grau. Cito-vos uma parte de um Catecismo Maçónico, sub-repticiamente publicado em 1723, que diz…o que faz uma loja justa e perfeita? Um Mestre, dois Vigilantes, quatro Companheiros e cinco Aprendizes com esquadro, compasso e nível…

Ora, esta afirmação de 1 Mestre e 4 companheiros, fez correr muita tinta sobre a existência ou não do Mestre como Grau. Desde a versão que foi Desaguillers que, secretamente e durante a impressão das Constituições, acrescentou este 3º Grau no Artigo XIII para assegurar o monopólio do mesmo à Grande Loja, até às versões mais verosímeis, como a do Ir:. Hughan que admite a existência do grau antes de 1721 mas que não era de uso geral, ou a versão do Ir:. Gould que atribui a mesma expressão a Mestres e Companheiros considerando o 1º uma redundância do 2º, enfim, a tinta continuará a correr a tentar explicar uma coisa muito mal explicada.

O que é certo, é que entre 1717 e 1721 o terceiro grau foi introduzido na Grande Loja de Londres. Certo, também, é que a redacção do Artigo 4º das Constituições de 1723 e 1738 não é exactamente a mesma fazendo referência a primeira a um Mestre de Loja e na segunda já definidos e separados os Graus de Mestre e Companheiros, logo, pode presumir-se que a referida Grande Loja de Londres, em 1723, teria o Grau de Companheiro como sendo o último da instrução.

O que parece, também, estar certo é que a introdução do terceiro Grau constituiu uma inovação lenta e gradual que espontaneamente se desenvolveu em várias Lojas e durando cerca de meio-século a generalizar-se, e isto na Inglaterra pois, na Escócia, só em 1735 o Terceiro Grau fez a sua aparição salientando Lee Vernon (na sua “História da Loja de Kelso) que…a 7 de Junho de 1754 os membros reuniram-se para constatarem, como lacuna essencial da sua constituição, só haver a prática de dois Graus (Aprendizes e Companheiros) …logo, desconhecendo o Grau de Mestre.

No Velho Continente, o Terceiro Grau propagou-se rapidamente a partir de 1737 (altura em que o Duque de Lorraine foi iniciado numa Loja que Desaguillers presidiu só para esta circunstância).

Compilando, podemos dizer que no início do Séc. XVIII não havia, para os maçons especulativos, senão uma cerimónia de iniciação e um só Grau. Após a formação da Grande Loja de Londres em 1717 organizaram-se dois Graus. O terceiro Grau foi, entretanto, introduzido propagando-se gradualmente nas Lojas Especulativas a partir de 1725 salientando-se que a existência de três Graus não foi universalmente aceite até 1757.

Terminado o prazer e o trabalho de deambular pelos corredores da História (ou das histórias) da Franco-Maçonaria quero crer que a pluralidade dos Graus só tem cabimento numa associação especulativa que usa o simbolismo como método de crescimento.
Quero crer, também, que a Maçonaria Especulativa transformou funções em graus reabilitando, quer as associações profissionais da Idade Média quer os velhos ritos dos mistérios da antiguidade que afirmavam …serem felizes os mortais que vivessem tais rituais…

Diógenes de Sínope M:.M:.

(R:. L:. Salvador Allende)

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