Fiquem vocês sabendo que, muito mais cedo que tarde, abrir-se-ão de novo as grandes alamedas por onde passe o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

(Últimas declarações de Salvador Allende ao povo chileno a 11 de Setembro de 1973, quando os aviões dos generais fascistas já bombardeavam o Palácio de La Moneda)

20 de dezembro de 2022

A MAÇONARIA COMO CAMINHO ENTRE O EGO E O EU

 


A MAÇONARIA COMO CAMINHO ENTRE O EGO E O EU.

O trabalho que me propus realizar e, que vos apresento aqui hoje, tem como principal objetivo ser uma reflexão pessoal. 

O que me levou em primeiro lugar a impor um conjunto de regras, a mim próprio, para o realizar.

Não consultei bibliografia, não recorri a definições previamente elaboradas por outros, sobre os conceitos do EU ou do EGO, nem tão pouco pesquisei sobre os mesmos. Ser parco nas palavras e sucinto nos raciocínios. Quis partir daquilo que sou, usar o senso comum e refletir sobre mim próprio. Colocar o EGO e o EU sobre perspectiva… apenas e só a minha perspectiva, nua, crua e despojada de intenções.

Para levar a cabo tal tarefa, comecei por recorrer ao poder da música que têm a capacidade de me toldar a mente e deixar aflorar a consciência. Isolei-me do mundo e principalmente dos outros. Imaginei que estava sozinho e sem espelhos. Sentei-me em frente a uma folha branca, e sem filtro, sem preocupação e até mesmo sem rumo, comecei a escrever. Bastaram alguns momentos de reflexão para deixar claro que na dualidade do EGO e do EU, o EGO é-me muito mais familiar.

Sei bem como o alimentar, o que o magoa e como me faz sentir. Apresenta-se como uma espécie de massagem intelectual, uma necessidade de confirmação de mim, que não raras vezes sinto que caminha no sentido oposto e cada vez mais distante do EU.

Talvez a expressão mais simples e o primeiro sinal de alerta da presença do EGO nas nossas vidas seja, curiosamente ou não, a simples utilização do pronome EU, quando nos referimos aos nossos feitos e virtudes: “Eu faço...”, “Eu sou...”, “Eu consigo…”,  expressões que tantas vezes usamos de forma inadvertida e que por si só são já uma afirmação sobre o outro.

Contrariamente, nos momentos em que nos deparamos com as nossas debilidades ou limitações o EU, pura e simplesmente, desaparece da frase e dá lugar à utilização de expressões sem sujeito, tornando-se assim impessoal e distante do próprio. “Não consigo” ou  “Não fui capaz” são apenas alguns exemplos daquilo a que me refiro. 

Olhando um pouco mais em detalhe o EGO reparo que é racional, cauteloso e metódico. Não me desafia para não dar lugar à falha, não arrisca para não desiludir e não colocar assim em causa a sua imagem, ou melhor, a imagem que tenho e têm de mim. O EGO é a sombra na caverna, a imagem refletida no espelho no momento da iniciação,mas não sou EU. 

Deixo agora o EGO de parte e concentro-me no EU. Deparo-me então com a incerteza, a dúvida. O EU esconde-se, foge-me por entre os pensamentos, tolda-me a razão e nega-se a surgir com a mesma clareza e objetividade demonstrada pelo EGO. No entanto, a sua presença faz-se sentir e manifesta-se em mim, nas emoções, nos medos e nos afetos. No reconhecimento da minha condição atómica, simples e universal. Sinto que me falta ainda tempo para o conhecer, vida para o viver, caminho para o descobrir … ou será que me falta apenas a coragem de o aceitar? 

Contrariamente ao EGO que é sombra ou reflexo, o EU é a origem, a fonte de onde tudo emana. A partícula do todo, existente em cada um de nós. Que muito mais que um olhar externo, requer uma reflexão interna, uma total privação dos sentidos, mas não do sentir, para se revelar. 

   Está na hora de deixar cair a venda e encarar a luz, voltar uma e outra vez ao momento da iniciação de profano a maçom. Olhar para ela não apenas como uma encenação ou um acontecimento parado no tempo, mas refletir em cada momento, em cada passo que dei, em cada sentimento que senti.  Ali naquele momento, de olhos vendados, exposto ao outro sem saber quem ele é, só me restava o verdadeiro EU, na forma de sentir e superar os desafios da própria iniciação, na convicção de seguir em frente. Frágil, mas guiado pela mão de outros que, tal como eu, viveram a mesma experiência.

Desde esse dia, e apesar de 16 anos passados, revisito  sucessivamente esse momento, na tentativa de o compreender cada vez melhor, mas também com o objetivo de não o esquecer, de o manter vivo em mim enquanto expressão plena do EU em total ausência do EGO.

A reflecção, o estudo, o convívio com os irmãos mas, acima de tudo a observação de mim mesmo como espetador dos meus atos, mostra-me que estou longe de completar o caminho, mas o momento da iniciação e o ritual mostram-me que tenho as ferramentas para caminhar.

Acredito que a maçonaria é o que me vai permitir fazer o caminho entre o EGO e o EU. Um caminho que terei de fazer sozinho, à medida das minhas possibilidades mas, com a certeza de estar acompanhado por todos aqueles que como eu, um dia tomaram o seu lugar na cadeia de união.

Irei tropeçar, cair, desviar-me do rumo certo, procurar atalhos, entrar em becos sem saída, mas terei sempre em mente o perigo que é dar mais protagonismo ao EGO que ao EU, porque sei que se o fizer, corro o risco de cair e não me levantar ou de me perder para sempre de mim próprio.

Almada Negreiros, M.'.M.'.

Resp.'. L.'. Salvador Allende

  


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