A Cadeia de União no Ritual Maçónico
«Círculo que se forma no final de uma sessão ritual maçónica. Simboliza a universalidade da Ordem, a união de todos os IIr⸫ à superfície da terra. Uma corrente ou corda luminosa, a que se liga o universo, segundo Platão, corrente de ouro que une o céu e a terra, símbolo dos laços entre os dois extremos do bem. Foi também através das correntes de ferro e diamante, dos encadeamentos do discurso, que Sócrates uniu a felicidade dos homens à prática dos justos.»
É desta forma sintética, alegórica e aos ombros de dois gigantes, dos mais virtuosos da Antiguidade Clássica, que o nosso Ir⸫ José Adelino Maltez descreve este ritual, numa das suas obras.
A Cadeia da União é antiga, remontando à Compagnonnage – a corporação de pedreiros francesa do século XII – onde é conhecida como "cadeia da aliança".
A formação da Cadeia de União constitui-se como coroamento de uma proveitosa sessão em L⸫, antecede o encerramento dos TTrab⸫ da L⸫ e, geralmente, ocorre apenas nas sessões no primeiro grau. Traduz-se num ato litúrgico que exponencia a fraternidade.
Os IIr⸫ retiram as luvas e reúnem-se, formando uma moldura circular em torno do Painel do grau e dos três pilares (Sabedoria, Força e Beleza). Cada Ir⸫ cruza o braço direito à esquerda para formar uma cruz simbólica de Santo André, unindo as mãos às do seu vizinho de ambos os lados, de modo que a mão direita agarra a esquerda do outro: o primeiro "cobre" e o segundo "apoia". Na tradição do Extremo Oriente, o lado direito corresponde ao yang, ou ao elemento masculino, sendo "o caminho do Céu", enquanto o esquerdo é o do yin, feminino, representando a Terra: "O Céu cobre e a Terra segura".
À medida que as mãos dos IIr⸫ são unidas para formar o círculo, cada Obr⸫ junta os calcanhares em esquadria e, encosta as pontas dos pés, direita e esquerda, correspondentemente com a esquerda e direita dos IIr⸫ adjacentes. O queixo está no peito, os olhos fechados e todos se concentram na "intenção do V⸫ M⸫", mesmo que ela não seja revelada. Os IIr⸫ permanecem silenciosos e meditativos.
Por fim, o V⸫ M⸫ balança os braços três vezes, em conjunto com todos os IIr⸫, e depois largam as mãos e "quebram" a corrente. Seguidamente, todos os OObr⸫ retornam aos seus lugares.
A Cadeia de União visa a integração de cada membro na cadeia Maçónica Universal, que a todos une pelos elos inquebrantáveis da Fraternidade e Igualdade, já que é efectuada por todos os membros presentes em L⸫, sem distinção de Grau ou Qualidade.
Não existe um elo maior que outro, porque na Instituição Fraternal não cabem hierarquias nem proeminências; todos são iguais no direito, todos estão obrigados ao cumprimento de idênticos deveres.
Todos estão sintonizados e vibram num mesmo diapasão, numa presença indispensável à solidez da cadeia, responsabilizando-se individualmente pela respectiva continuidade.
A sua formação circular, confere um papel protector e é a única estrutura geométrica que mantem a forma se retirarmos ou integrarmos um segmento. É um esforço colectivo de energias físicas, emocionais e mentais, onde a acção conjunta dos vários elementos produz um resultado maior do que a soma de todas as partes, resultando na Egrégora Maçónica.
Francisco Ariza, Ir⸫ contemporâneo, nascido em Espanha, e com diversos livros publicados sobre a Arte Real, defende que este ritual funcionou como suporte para uma invocação sagrada, sendo uma prática coletiva de "encantamento". O encantamento é uma invocação sagrada, e é apenas um meio de activar uma memória do que já está dentro do agente, despertando suas faculdades interiores.
Ao contrário da oração, o encantamento não é uma petição e nem sequer pressupõe a existência de qualquer coisa exterior, que toda a petição supõe necessariamente, porque a exterioridade não pode ser entendida senão em relação ao indivíduo, que aqui é precisamente superado. É uma aspiração do ser para com o Universal, a fim de obter o que poderíamos chamar em linguagem um tanto "teológica" de graça espiritual, isto é, essencialmente uma iluminação interior que pode ser naturalmente mais ou menos completa de acordo com o caso.
Segundo René Guénon, M⸫ e notável escritor e pensador francês do século XX, a acção da influência espiritual deve ser vista no seu estado puro, ou seja, em vez de procurar fazê-lo descer, como na oração, o ser tende, pelo contrário, a elevar-se em direcção a ele. O encantamento assim definido como uma operação inteiramente interior pode, no entanto, em muitos casos, expressar-se e "apoiar-se" externamente por palavras ou gestos que constituem ritos iniciáticos, como o mantra na tradição hindu ou o dhikr na tradição islâmica, que devem ser pensados como uma produção de vibrações rítmicas que reverberam através de um domínio mais ou menos extenso na série indefinida dos estados do ser.
Por outro lado, mas não menos importante, Guénon examinou outro aspecto da Cadeia, que se refere à interacção entre o "espesso" e o "fino". Pela física sabemos que cada figura geométrica sólida provoca ondas que variam de acordo com a forma da figura. Estas podem ser medidas de acordo com a sua frequência vibratória.
Os egípcios sabiam deste fenómeno e, de facto, usavam-no para proteger as câmaras dos Reis, emitindo ondas que vibram na fase eléctrica, nocivas para as entidades vivas: o homem fala frequentemente da "maldição de Tutankhamon". Pelo contrário, as igrejas emitem ondas que vibram na fase magnética, por isso são favoráveis para os humanos. Nos tempos antigos, os maçons tinham consciência desta peculiaridade e, por isso, protegiam as suas construções através da pedra angular, que tem uma forma trapezoidal.
Nada disto é magia, muito menos feitiçaria, apenas o reconhecimento de factos físicos. A interpretação do seu efeito está sujeita a discussão, é certo. No entanto, não há nada no ritual maçónico de que devamos ter vergonha. Os iniciados rejeitam a distinção artificial entre física e metafísica; Eles estão conscientes de que "ritos e símbolos são fundamentalmente apenas dois aspectos de uma única realidade, que não é, afinal, outra coisa senão a 'correspondência' que une tudo através de todos os graus de existência, de tal forma que o nosso estado humano pode entrar em comunicação com ou, pelo menos, perceber vagamente, os estados superiores do ser".
Se, do ponto de vista conceptual enlevei-me com as visões dos ilustres IIr⸫ que aludi, na perspectiva meramente pessoal, até mesmo emocional, pretendo apenas acrescentar que a Cadeia de União representa o momento mais alto da congregação maçónica, pois nela sinto a solenidade do ritualismo, o poder da conexão fraterna e a fortaleza do todo.
A Cadeia de União é, efectivamente, uma transbordante experiência da Egrégora Maçónica. Os seus efeitos partem do solo do templo rumo ao espaço sideral, expandindo energia humana, fraterna, benfeitora e radiante. É uma experiência física com significados e consequências espirituais.
Interpreto também que, sendo um eterno Apr⸫, o M⸫ inicia o seu percurso no primeiro grau, onde mergulha num processo de introspecção, autoconhecimento e aperfeiçoamento, deliberadamente individualista, e conforme segue o seu caminho de progresso pelos segundo e terceiro graus, tende a interagir cada vez com mais propriedade, conhecimento e assumindo responsabilidades acrescidas perante os seus IIr⸫, numa clara metamorfose postural e comportamental, onde o nós se sobrepõe ao eu.
Concluo o meu trabalho citando Oswald Wirth, um dos autores Maçónicos que mais admiro, numa passagem sobre o momento da iniciação, que me parece ser, de todo, aplicável ao conceito da Cadeia de União:
“(…) ele (o homem) não é só, porque reconhece ao seu redor semelhantes animados de uma mesma vida, dotados, como ele, de inteligência e acessíveis aos mesmos sentimentos. Ele descobre então, na sua genialidade, que os semelhantes não fazem senão um, que eles constituem, no seu conjunto, o Grande Homem Colectivo que é permanente, enquanto o pequeno homem individual é efémero.”
Abranches Cardoso, Comp⸫ M⸫
Resp.'. L,', Salvador Allende A Or⸫ de Lisboa
Bibliografia consultada:
1 - «Abecedário Simbiótico», José Adelino Maltez, ed. Campo da Comunicação, 2011;
2 - «La Symbolique Maçonnique», Jules Boucher, ed. Dervy, 1990;
3 - «Perspectives on Initiation», René Guénon, ed. Sophia Perennis, 2001;
4 - «The Great Triad», René Guénon, ed. Sophia Perennis, 2001;
5 - «O Companheirismo Maçônico», Rizzardo da Camino, ed. Madras, 2005;
6 - «Uma Síntese da Simbologia Maçónica», José Marti M⸫M⸫ – R⸫L⸫ Ocidente (G⸫O⸫L⸫);
7 - «A Cadeia de União», Salvador Allende M⸫M⸫ – R⸫L⸫ Salvador Allende (G⸫O⸫L⸫);
8 - «Les Mystères de L’Art Royal - Rituel de L’Adepte», Oswald Wirth, ed. “Le Symbolisme”, 1972
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