Os períodos pandémicos - da Importância do Ritual (ou da falta dele)
I – Introdução
A suspensão dos trabalhos em Loja, relativa aos diferentes picos da pandemia Covid, que desde há 2 anos, mundialmente nos tem assolado, em resultado das directivas das autoridades de Saúde, do Governo e Presidente da República, subscritas pelo Grão-Mestre e C:.O:., obrigou-nos a procurar e resolver, por nós próprios, com a iniciativa inicial de alguns (poucos) IIrs:. uma alternativa possível, para continuarmos interligados e a trabalhar, embora de forma diferente da preconizada ritualisticamente, com o objectivo último de que a Loja não abatesse colunas.
A prioridade foi a de, entre Abr.20 (já que em Mar.20 ainda realizámos 1 Sessão) e logo que possível (Out.21), continuarmos a assegurar, nos termos possíveis, o trabalho programado, tentando não descaracterizar os conteúdos das pranchas previstas. Efectivamente, após alguns testes iniciais entre Set. e Nov.21, só em Dez.21 reiniciámos o nosso percurso alternativo (correspondendo a 5 a 6 meses de paragem).
O resultado dos testes anteriores, traduziu-se no recurso às plataformas de Videoconferência digitais, com os inconvenientes por todos conhecidos, mas também com algumas vantagens, que julgamos pertinentes trazer à discussão com mais pormenor. Atendendo aos novos horizontes tecnológicos que se estão a desenvolver (gostemos ou não, mas eles estão aí, com a chamada “Sociedade 4.0”), um dos quais é o teletrabalho e as Videoconferências, utilizando os equipamentos informáticos normais que cada um de nós possui.
Em nossa opinião, a NAO:. deveria continuar observar com crescente atenção (como pontualmente fez) esta evolução tecnológica, de molde a preparar o futuro, modernizando-se e adaptando-se às tecnologias emergentes, mas sem perder o seu carácter intrinsecamente iniciático, que nos distingue e individualiza perante a sociedade. Não nos esqueçamos que no passado fomos sempre caracterizados por «andarmos à frente do nosso tempo», preparando o futuro de países e sociedades (maioritariamente não democráticos ou absolutistas), de acordo com os nossa trilogia basilar de sempre – L:.I:F:.). De referir que existiu uma interessante experiência a nível nacional, com a Grande Dieta, que considerámos bastante positiva, oportuna e eficaz, apesar dum percalço (aparentemente intencional) entretanto surgido.
É habitual ouvir a alguns IIrs:. mais antigos, com bastante conhecimento e experiência acumulados, dizer que: “a Maçonaria não se ensina, aprende-se!”
Poderemos então concluir que a experiência adquirida , por via digital, terá servido para muito pouco, ou relativamente quase nada?
Se me permitem, a nossa interpretação é substancialmente distinta, pois apesar de não termos o suporte essencial do Ritual, a conexão entre IIr:., (que se vinha cada vez mais a «deslaçar», com previsíveis graves consequências para o futuro) relançou-se, a apresentação e discussão dos temas basicamente programados, constituiu trabalho efectivo, permitindo discussões bastante interessantes, sem o aparente mas real «desperdício de tempo» que o ritual introduz, induzindo maior «produtividade» às discussões. De salientar que parte significativa das Loj:. dos grandes centros, duma forma ou outra, também seguiu esta alternativa (algumas com objectivos mais restritos ou conviviais, a menor parte continuando os trabalhos, de modo análogo ao por nós efectuado).
Poderemos ver aqui alguma possibilidade de actuação parcial para o futuro? Estamos por princípio de acordo, sempre que tal seja possível, no aproveitamento das novas tecnologias para o trabalho, mesmo atendendo à especificidade do carácter maçónico, como já vimos defendendo em trabalhos apresentados internamente, desde os últimos anos (que podem consultar no N/ Blog), desde que óbviamente não ponham em causa os princípios iniciáticos essenciais, que nos unem e identificam, já que, a seu modo, contribuem também quer para a aceleração de processos e objectivos (tão necessária), sempre que o trabalho «normal» não seja possível, ou tenha determinadas características, quer para o reforço da união dos IIr:. da Loja.
Existem efectivamente algumas vantagens adicionais que devemos ponderar, tais como a rápida Interligação entre os Irmãos, um mais fácil cumprimento da pontualidade de inicio e fim das reuniões, devido a estarem por princípio, no seu ambiente residencial, as economias de escala adjacentes (tempos e custos de deslocações e refeições), que podendo ser insignificantes para muitos IIr:., são contudo efectivamente significativas para parte substancial dos restantes.
A conclusão a que chegámos é pois a de que, para simples sessões de carácter básicamente administrativo, que pelo menos o Quadro da Loja é obrigado a ter várias vezes por ano, este é um cenário com muitas vantagens, apresentando sempre óbviamente o perigo de poder existir alguma «espreitadela» alheia, como em qualquer sessão desta natureza, contudo existem alguns procedimentos que, a serem respeitados, a par das características e correcta parametrização da aplicação utilizada, poderem minimizar estas probabilidades.
Quanto à leitura e discussão de Pranchas, se existirem boas ligações (qualidade de som e imagem), como normalmente acontece agora com a banalização da Banda Larga, é bastante produtiva, pois podemos alongar ligeiramente, quer a duração da Pr:., quer sobretudo o tempo de discussão pelos IIr:. que o pretendam, sob o Controlo do V:.M:., que dirige Sessão, sem que tal implique um atraso significativo dos trabalhos (antes pelo contrário), devendo e podendo o Orad:. tirar as respectivas conclusões, ou os VVig:. ou o Sec:. intervirem, sempre que a altura o impõe ou aconselha.
Sendo este um processo mais informal, pode-se permitir, em determinadas condições pontuais, que alguns Aprendizes mais avançados, ou CComp:. (após a exclusão daqueles, controlada efectivamente por quem dirige a reunião) possam tomar a palavra, quanto mais não seja, para rever o respectivo questionário ou outras questões, e dessa forma recordar pontos essenciais do respectivo grau, melhorando conhecimentos e ajudando a uma maior integração na dinâmica grupal criada, absolutamente necessária para o correcto funcionamento da Loja.
Sobretudo (mas não só) nos centros de maior congestão e necessidades de espaço (como Lisboa Porto) , esta afigura-se-nos uma alternativa a disponibilizar esporádica ou pontualmente, sempre que não consigamos Templo para tal (ou que este seja de tamanho diminuto), quer enquanto se mantiverem as restrições pandémicas, quer para o futuro e desde que a Sessão possa ser, formalmente, não ritualizada (como detalharemos mais à frente). Além disso temos a possibilidade muito interessante, de podermos ter (se a Loja quiser trabalhar), pelo menos até 4 reuniões mensais, sem estar sempre dependente da dificuldade ou impossibilidade de encontrar, no mesmo dia (ou noutro) algum espaço livre.
Já quanto a votações (por braço no ar), sempre que tal seja possível, também se podem fazer sem problemas, já que todos obversam todos e o M:.Cer:. (ou neste caso o Sec:. Ou o VM:.) podem anunciar os resultados. Aqui chegados coloca-se a questão de fundo:
II – Então para que serve o Ritual?
O meio que privilegiamos para uma rápida aquisição de Conhecimento é sobretudo o Estudo. Para se chegar à Sabedoria é preciso tempo e vivência. Existe contudo um processo para acelerar este percurso, incentivando a Sabedoria: a utilização, execução e prática do Ritual, uma vez que se o Estudo é um meio de aquisição de Conhecimento, o Ritual é o indutor de Sabedoria, parte que estará, à priori, fortemente limitada à partida, dada a forma razoávelmente «desenquadrada» ritualisticamente como trabalhamos teleinformáticamente.
Enquanto o Estudo estimula, desenvolve e faz funcionar a Inteligência Racional, o Ritual e a sua prática, estimula e desenvolve a Inteligência Emocional. Esta é bem mais profunda do que aquela, pois combina o conhecimento, o raciocínio e a Intuição. O que estudámos e discutimos nas nossas Sessões «teleinformáticas» pode dar-nos essencialmente, via memorização, a ferramenta necessária para agir. Mas será que não poderemos avançar um pouco mais, além disso?
Existindo aqui um explícito limite (algo mais teórico que prático?) à passagem do Racional para o Emocional, que até ao momento nenhuma tecnologia permite ultrapassar, duvidando mesmo nós que tal alguma vez venha a ser possível, pelo menos até meados do Século (representando um grave perigo para a Humanidade, se for atingido). Para tal será necessária a aplicação de pesada algoritmia baseada na Inteligência Artificial (IA) a aplicações em «Big Data Centers», também controladas por ela, com possibilidade de ir auto-aprendendo, ultrapassando o estado racional. Apesar deste «momento» ainda estar razoávelmente distante, alguns artigos científicos ultimamente surgidos, com a utilização de animais mais próximos da família humana, sugerem que parcialmente tal poderá ser atingido. A ser assim, algo nos sugere alguma parte do Racional poderá vir a passar para o Emocional através de algum tipo de «grupismo conduzido via teleinformática»
Não nos esqueçamos que nos inícios da Humanidade, não existindo ainda a escrita - as inúmeras gerações dos primeiros «homo sapiens» viveram sem ela… -, a aquisição de conhecimentos e o acesso à Sabedoria processavam-se essencialmente através da Tradição Oral. Essa via consistia no único modo para que os mais velhos e mais experientes transmitissem o que sabiam aos mais novos, que não tinham experiência.
Os primeiros diziam o que tinham aprendido ao logo da vida, executavam perante os mais novos os gestos necessários para o concretizar, repetiam-nos uma vez e outra, tornando a repetir, muitas e variadas vezes, tanto quanto fossem necessárias, as palavras, os gestos, os actos de que dependiam (a alimentação, a segurança e a sobrevivência, não só individuais como do grupo). Não esqueçamos que naquelas épocas não existiam nem escolas nem aulas, enquanto actividades decorrentes naquelas.
Como já percebemos que o ritual e o seu exercício estimulam a nossa Inteligência Emocional, induzindo a obtenção de Sabedoria, repetindo uma e outra vez as mesmas palavras (sem pretensão de as decorar, mas mais de as perceber), para transmitir as mesmas noções, executando repetidas vezes os gestos e as acções adequadas para a obtenção dos resultados que se pretendiam, isto não representa mais do que… a execução dum ritual!
Ritual e Rito não são a mesma coisa, mas estão interligados. Numa Obediência ou Organização iniciática, cada um dos graus que compõem um Rito, apresenta um Ritual específico, ou seja um conjunto coerente de instruções e procedimentos específicos, que levam à sua aprendizagem, compreensão/conhecimento, correspondendo ao sistema e objectivos específicos do Rito, a nível desse Grau.
Seria possível a realização de uma sessão maçónica tradicional (Solene, Iniciação, Aumento de Salário, Elevação à Mestria e outras), sem o Ritual?. A resposta é inequívocamente não!!!.
O Ritual, sendo um conjunto de actos, gestos e palavras, proferidos e executados sempre de forma similar, é o fio condutor do trabalho em cada Sessão da Loja., agregador e unificador dos trabalhos e, ao mesmo tempo, da identidade e solidariedade maçónica entre todos os Irmãos, respondendo aos objectivos iniciáticos de cada Grau.
Segundo M. Pinto dos Santos (10): “….. O Ritual maçónico, por identificar o rito praticado através de sinais, idade, tipo de deslocamento ritualístico, marcha, toques etc, funciona igualmente como uma forma de reconhecimento de grupo entre Maçons.”
Cada Grau (mais notoriamente a partir de M:.M:.) tem fundamentalmente como base, segundo vários autores como I. Mainguy (1) e (6), Bernheim (10) & outros: “um mito e uma lenda estruturadas, em que se fundamenta o seu desenvolvimento e que representam os perigos e as armadilhas a evitar para alcançar o caminho a percorrer”.
Daí que para esse (ou qualquer Grau), seja necessário saber e perceber o Ritual, para entender o objectivo do mito e da lenda, por forma a que o Maçom consiga extrair as «chaves» que dão acesso à percepção da mensagem e conhecimentos essenciais, que o «mito» e a «lenda» proporcionam, e daí a sua inesgotável riqueza. Tal é completamente impossível com as Sessões Telemáticas (com a tecnologia, aplicações e sistemas existentes até ao momento, apesar de já terem sido efectuadas 2 experiências, uma na Inglaterra outra nos EUA, sem resultados substantivos, mas com alguns dados interessantes).
Recordamos que em Maçonaria (e específicamente no Ritual) tudo tem um significado, cujo âmbito pode ser mais estreito ou alargado consoante o conhecimento e a interpretação simbólica que o Ir:.. consiga alcançar. Por isso é que a Maçonaria que praticamos e defendemos é essencialmente anti-dogmática, senão estaríamos a obrigar cada Irmão a interpretar cada instrução do Ritual e sobretudo o simbolismo que representa, dum modo rígido, dogmático, como se estivéssemos numa tradicional cerimónia religiosa.
Porque é que o Ir. Exp:. (no início da Sessão e quando ordenado pelo VM:.) coloca o esquadro por cima do compasso sobre o Livro da Lei? Jules Boucher (4), citando Plantagenet afirma que: “da Antiga tradição, o esquadro cobre os dois braços do compasso, indicando que neste grau não se pode exigir mais do neófito do que confiança e sinceridade, consequências naturais da equidade e da rectidão, o que significa que a matéria (esquadro) ainda domina o espírito (compasso), sendo que o grau de abertura do compasso deve ser sempre de 45º” (para todos os graus simbólicos)”.
Porque é que os diferentes Oficiais se colocam na posição e local que o Ritual preconiza? Porque é que o Ir:. Exp:. executa determinadas funções, nomeadamente o abrir e fechar o Quadro / Tapete da Loja e o que representa? Porque existem 3 Colunas a enquadrá-lo e o que representam? E por último, porque é que em cada Sessão (normal) se deve fazer, antes da conclusão, a Cadeia de União, um dos actos simbolicamente mais significativos e importantes do Ritual.
Enquanto que a linguagem da razão é necessáriamente limitada, "o Simbolismo, enquanto suporte da intuição transcendente, abre possibilidades verdadeiramente ilimitadas" (René Guénon, «Perspectivas sobre a Iniciação») (2).
É nosso dever efectuar uma análise e reflexão regular sobre o conteúdo dos rituais e das respectivas instruções, um dos meios de abrir a nossa consciência ao Essencial. Sendo uma prática prolongada, é muitas vezes difícil e desafiadora, já que de grande exigência, onde segundo I. Mainguy (1): "o esquadro deve regular as nossas acções e o compasso traçar os justos limites que devemos observar na nossa conduta para com nossos semelhantes".
Desempenhando o Ritual um papel primordial no desenvolvimento da procura iniciática que individualmente percorremos, em nossa opinião, restringir a procura iniciática exclusivamente ao cumprimento rigoroso do Ritual traduz uma visão algo limitadora e/ou castradora no âmbito da formação geral, e sobretudo da complementar.
É por isso que a nossa Obediência, defende e privilegia a interpretação, face à memorização (contrariamente à corrente anglo-saxónica, p. ex:) e preconiza o estudo e aprofundamento maçónico individual e permanente, de cada maçom.
O mundo está numa crise profunda, que a pandemia e as graves perturbações decorrentes das alterações climáticas originadas pela destruição progressiva e indevida do meio ambiente pelo ser humano, só vieram intensificar gravemente. As referências e os parâmetros alteram-se e deslocam-se rápidamente, as mentes duvidam e muitas vezes deixam-se corromper e as referências mais tradicionais vacilam. Seria muito difícil que a Maçonaria, constituída por seres humanos, conseguisse permanecer impermeável, protegendo-se das desordens e problemas que persistentemente assolam o mundo profano.
A Maçonaria deve permanecer fiel às suas fontes tradicionais, para conseguir transmitir correctamente. Mas ela própria é também influenciada adicionalmente pelas mudanças que ocorrem no mundo exterior. Por exemplo o Ritual do Apr:. do R.E.A.A sofreu pelo menos 8 alterações no século XIX e 4 no século XX, conseguindo contudo manter no essencial, o núcleo central da Tradição….
Quando passarmos ao Oriente Eterno, podemos ter acumulado riqueza, títulos e prestígio, mas de que nos servirão? O que irá realmente perdurar é o que tivermos conseguido transmitir: os valores, conhecimento, ética, filosofia de vida, um exemplo de comportamento, frutos esses que a geração seguinte colherá, se tivermos a capacidade de os transmitir correctamente.
O objectivo fundamental da transmissão é a incorporação na cadeia iniciática, na qual cada um tem o seu papel a desempenhar para assegurar a continuação da obra. Esta transmissão, esse despertar gradual da consciência é feita através da palavra, já que se trata antes de tudo de uma transmissão oral, como vimos, desde os tempos ancestrais.
O verdadeiro homem, livre e esclarecido, é um agente de mudança para quem a transmissão é uma ferramenta básica, uma vez que qualquer parte do que recebeu e aprendeu, será transmitido. Só os fundamentalistas podem desejar que o mundo permaneça congelado nos costumes, valores, até mesmo erros ou impasses. Assim aqui se coloca outra questão fundamental: podemos transmitir «teleinformáticamente»? Em primeira mão respondemos afirmativamente, mas com bastantes limitações, dado que:
É essencialmente o ritual que nos permite tornar viva essa tradição. É também o mesmo ritual que participa e simultaneamente organiza a criação da Loja. Estabelece uma ordem que nos permite transcender o espaço e o tempo. É transportado e vivido pelos membros da Loja, ocupando cada um a sua diferente função, com a vantagem de que, no nosso caso, os Oficiais da Loja (o corpo de actores), são substituidos anualmente, evitando eficazmente a esclerose e a cristalização …, se for correctamente seguido e a não existirem «carreirismos» espúrios e /ou candidatos a «donos» de Loja….. a pertubá-lo.
O nosso trabalho em Loja é um método de relação pessoal entre homens livres que colaboram para que a loja se converta num centro de união entre pessoas de diferentes idades, biografias, horizontes espirituais, ideológicos e filosóficos, que se reconhecem entre si, nos seus graus e qualidades, que cooperam e que reforçam a união entre si quando cumprem o Ritual com rigor, inserindo-se assim correctamente na Cadeia de União.
A Cadeia de União é no Ritual, provávelmente do ponto de vista simbólico, uma das cerimónias que mais directamente apelam à solidariedade e fraternidade maçónica, sendo seguramente um dos actos mais significativos da dedicação que trazemos ao nosso compromisso com os sublimes princípios maçónicos». Segundo Jean-Pierre Bayard (4), só se deverá desenrolar num ambiente tradicional e numa atmosfera particular, na ausencia dos quais permanecerá sem valor (meditemos sobre isto…. ). Esta é uma das limitações físicas das reuniões telemáticas, mas do ponto de vista puramente simbólico, nada impede de a simularmos ao concluir as Sessões, despedindo-se cada Irmão com o braço direito sobre o braço esquerdo, ambos colocados junto ao peito e dirigindo-se cada um, simultâneamente aos restantes, sob o comando do VM:., como temos efectuado.
Continua a ser, embora de forma truncada (pela ausência física local) um momento de reflexão, de solidariedade, de união, em que cada um sente que contribui para o grupo, mas também sente que beneficia da força comum do grupo. A Cadeia de União é uma prática pela qual se forma, reforça e assinala a coesão do grupo. Nos momentos em que o grupo assim se une, diluem-se os egos individuais e avulta o colectivo, na busca de uma egrégora fortalecida e fortalecedora.
A palavra ritualizada tem uma força e um calor que multiplica a sua eficácia de comunicação, portanto as nossas pranchas devem, de um modo geral e por princípio, cingir-se ao conceito de ajuda, de superação, dando à transmissão maçónica a intensidade que lhe corresponde, não só para aquisição de Conhecimento, mas também para incorporação desta cadeia de Irmãos em que se traduz a Loja, numa Tradição, de que fazemos parte, como mais um conjunto de anéis em aprendizagem contínua, o que parcialmente pode ser efectuado através de reuniões teleinformáticas, segundo anteriormente expusemos.
Devemos pois trabalhar para garantir e manter a transmissão do método ritualístico a salvo de contaminações, mas adaptando-o aos tempos correntes, e isso exige a lealdade de cada Maçom para com a integridade e a riqueza do "tesouro” maçónico recebido, ou seja: mantendo os rituais, mitos, símbolos, costumes e as virtudes morais e intelectuais sobre as quais tradicionalmente se baseia a nossa tradição maçónica, embora agora «digitalmente» duma forma muito mais simplificada, mas mesmo assim produzindo parte do efeito pretendido, que afinal traduz as limitações inerentes à metodologia possível.
III –Concluindo
Os rituais maçónicos ao promoverem Princípios e Valores apelam diretamente às caraterísticas básicas do cérebro humano. Os princípios e Valores expostos, facultados, não se destinam a ser meramente apreendidos pela Inteligência Racional, através do estudo e da aquisição de conhecimentos. Procura-se atingir a Inteligência Emocional, o âmago da personalidade de cada um e aí efetuar as modificações inerentes a esses Princípios e Valores.
O conhecimento global do Rito só será atingível na sua plenitude, ao conseguir-se progredir consistentemente até ao topo, e mesmo assim o estudo e a pesquisa não terão fim, já que a procura do conhecimento, a caminho da Luz, não tem limite (“somos sempre eternos Aprendizes”), e só terminará com a passagem ao Oriente Eterno.
Os rituais maçónicos destinam-se assim, para além da integração de indivíduos em grupos, a propiciar a modificação de cada um, através da interiorização de Princípios e Valores morais, que devem nortear a conduta de cada um,
Só a participação consciente no Ritual nos pode fornecer a profundidade comunicativa que permite fazer Maçonaria. Sem essa profundidade não existirá trabalho maçónico efectivo, podendo contudo efectuarem-se sucessivas aproximações limitadas, através da «comunicação digital».
Se há algo que verdadeiramente se aprende com os rituais é que estamos sempre a aprender algo de novo. As palavras, os gestos, os actos, são os mesmos desde o princípio, mas antes podíamos não compreender aquele particular significado, porque não estávamos ainda preparados para tal, o que se vai atenuando pela experiência adquirida. Por isso falamos de um método maçónico que foi construído e reelaborado, enquanto preservado ao longo do tempo, mediante uma Tradição, transmitida de geração em geração, que é o nosso maior e melhor tesouro.
Este discurso é Hoje o que que corresponde a "este tempo", porque esta é a linguagem actual, aquela que podem compreender os homens e as mulheres da actualidade, podendo-se afirmar que "o espírito permanece, mas a letra altera-se sem atraiçoar o espírito". Esse deve ser o nosso caminho como projecto que se orienta na direcção da Universalidade.
Se o trabalho iniciático se suporta no Ritual, o trabalho maçónico individual apoia-se, mas não se pode esgotar nele, se queremos prosseguir, já que necessitamos de trabalhar e investigar sem parar e sem barreiras, para a aquisição progressiva de Conhecimento, essencial ao desenvolvimento consistente do percurso maçónico, o que só ao Iniciado e à sua vontade diz respeito.
Não podemos dissociar a Maçonaria das suas formas de expressão essenciais, o Ritual e os Símbolos, que constituem a sua estrutura fundamental e da qual são parte integrante. Viver o Ritual, é viver activamente a Maçonaria e ao mesmo tempo aceder uma das suas mais profundas riquezas.
Recordando novamente D. Béresniak (5),: “ .....A Loj:. deveria ser o lugar privilegiado para o estudo do simbolismo (que o Ritual incorpora). O clima que lá se encontra é o mais propício e estimulante para explorar esta ciência. Lamentávelmente não é assim, já que muitas Loj:. desprezam o simbolismo e outras confundem simbolismo com ocultismo, interpretando à letra as analogias simbólicas, como se fossem verdades eternas em si mesmas.” (f.c.).
Isto não quer dizer, que as sessões de carácter essencialmente administrativo, ou noutras de menor importância ritualistica, onde exista a exposição de uma Pr:. de carácter mais filosófico ou técnico, se possam utilizar, com as vantagens já expostas anteriormente, as reuniões via telemática, que foram o nosso «corpus vivendi» durante praticamente os 2 anos de contenção pandémicos (que infelizmente se prevêm continuar, embora com menores restrições, neste final do ano e primeiro trimestre de 2022, pelo menos), mas que nos permitiu concluir com sucesso, a quase totalidade (excepto as de carácter solene e/ou ritualístico) correspondente ao plano traçado para o ano 2020_21.
Portanto e sómente nas condições definidas de início, propomos excepcionalmente a continuidade deste tipo de reuniões, com a vantagem adicional de até podermos fazer uma Sessão por semana, sem estarmos dependentes de Sala (em pelos menos duas delas).
Julgamos que a NRL:.. e Obediência só terão a ganhar com uma solução mista, nos termos em que expusemos.
Que fique também claro para os mais renitentes, que não estamos a colocar em causa o Ritual nem a sua presença insubstituível nas sessões maçónicas normais e sobretudo especiais (Iniciação, Elevação, Aumento de Salário, Exaltação, Comemoração, Evocação, Simbólica, Pompa Fúnebre, etc).
É simplesmente uma questão de adaptabilidade, aproveitando com mais eficácia as facilidades que as novas tecnologias nos trazem, ou não terá sido também isso que a Maçonaria tem feito ao longo do tempo?. Recordemos que desde o início não existiam Rituais escritos e quando apareciam eram manuscritos, só mais tarde passaram a ser impressos…., sem referir as várias alterações sofridas ao longo dos Séculos XVIII, XIX e XX, sem que os fundamentos ritualísticos fossem colocados em causa.
Salvador Allende M:. M:.
Dez.2021 (e:. v:.)
(Solstício de Inverno)
Bibliografia
1 – “Procura Iniciática e Transmissão” - Mainguy, Irène - (Conferência realizada em 2011 - Aniversário da Loj:. Acácia / tradução do original por «Jakim & Boaz»)
2 – “O Ritual como método de Transmissão” - Guerra, Victor– (“victorguerra.net”, Abril.2013)
3 – “Ritual do Grau de Aprendiz” (N:. A:. O:.)
4 – “A Simbólica Maçónica” – Jules Boucher – Editora pensamento, Ed. 14 – S- Paulo , 2006
5 – “L’Apprentissage Maçonnique - Une École de L’éveil» - Béresniak, Daniel, Éditions Detrad – 2009, Paris
6 – “La Symbolique Maçonnique du Troisième Millénaire” - Mainguy, Irène -– Éditions Dervy, 2006, Paris
7 – “Coluna Norte – Tributo a Daniel Béresniak” - Dógenes de Sínope, M:. M:. –(Blog “Jakim & Boaz”)
8 – “Dictionnaire de la Franc-Maçonnerie” – Ligou, Daniel – Éditions «PUF» - Paris (2015)
9 – “A Importância do Ritual” - Rui Bandeira - Comunicação por meios virtuais no âmbito da Academia Maçónica (GLRP/GLLP – Fev.21)
10 –“Dicionário da Antiga e Moderna Maçonaria “– Manuel Pinto dos Santos – Lisboa (2012)
Sem comentários:
Enviar um comentário