Fiquem vocês sabendo que, muito mais cedo que tarde, abrir-se-ão de novo as grandes alamedas por onde passe o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

(Últimas declarações de Salvador Allende ao povo chileno a 11 de Setembro de 1973, quando os aviões dos generais fascistas já bombardeavam o Palácio de La Moneda)

8 de janeiro de 2020

Maçonaria no Séc. XXI – porquê e como


Maçonaria no Séc. XXI – porquê e como

Foi-me proposto (editado pela comissão Editorial do Blogue) que desenhasse uma peça de arquitectura sobre o tema “Maçonaria no Séc. XXI – porquê e como”. Na verdade, melhor do que maçar-vos com estas linhas, seria sugerir-vos a leitura da excelente prancha que, sobre este tema, o nosso Ir.’. Salvador Allende nos deu em Julho do ano passado.
Esta é, aliás, uma matéria extensa, seja pelo “porquê” seja pelo “como”. E para melhor estruturar o pensamento e a escrita sobre o tema, comecei por reler os textos basilares da N.’.A.’.O.’. – a Constituição e o Regulamento Geral – onde estão bem claros os princípios e valores que regem o nosso ser e estar maçónico e que, por extensão e em resultado do nosso trabalho de desbaste da pedra bruta, regem – ou devem também reger – o nosso ser e estar profano.
Tive, além disso, o privilégio de poder juntar à minha própria reflexão e leitura, também a leitura de algumas pranchas sobre o tema, feitas nos últimos anos pelo Venerável e pelos past-Veneráveis da nossa Loja.
Porquê então ser Maçon e persistir na tradição Maçónica no Sec. XXI? (“tradição” com o sentido de “continuidade”, de “passar adiante”, que lhe foi dado pelo nosso Sapientíssimo G.’.M.’. na sua mensagem do Solstício deste Inverno).
Ao longo dos últimos 300 anos, a Maçonaria foi evoluindo tendo em conta o meio em que se inseria, a cultura, o desenvolvimento tecnológico, a situação política, económica e social do seu mundo envolvente.

A sua trajectória no mundo não foi linear. Ela teve momentos de glória e de tragédia. Ditou o futuro de grandes países, como sucedeu com a monarquia inglesa (Eduardo VII, Eduardo VIII, Jorge IV ou Jorge VI) e com vários presidentes dos Estados Unidos da América do Norte, em particular os seus pais fundadores George Washington e Abraham Lincoln. E foi severa e cruelmente perseguida – pelas religiões, com algumas encíclicas papais excomungando os maçons, ou com a permanente conspiração da Opus Dei e pela acção de déspotas como Mussolini, Hitler ou Franco que mandaram matar centenas de maçons. Também em Portugal se registaram muitos avanços e adversidades, consequência dos regimes mais liberais ou mais repressivos em que conseguimos afirmar-nos e/ou sobreviver, em especial durante a Inquisição e a ditadura salazarista, pela sua violência e duração.
Mas ela aí está! A Maçonaria continua de pé, persistindo na sua obra de aperfeiçoamento da Humanidade através da elevação moral e espiritual do indivíduo !
Essa obra é hoje da maior importância. Porque num momento em que ressurgem os fantasmas de novos fascismos, da intolerância violenta, política e religiosa, da guerra global, é indispensável a mobilização dos homens e mulheres que “adotam como divisa a Liberdade, a Igualdade e a Fraternidade, e como lema a Justiça, a Verdade, a Honra e o Progresso” e que defendam os princípios maçónicos de “procura da conciliação dos conflitos” de “união dos homens na prática de uma Moral Universal”, e de “condenação das regalias injustas, no respeito da personalidade de cada um”. 
Quereis melhor porquê para começarmos a conhecer e a estudar o que é a Nobre Arte Real e para desejarmos integrar e fortalecer esta nossa Augusta Ordem que “não aceita dogmas e combate todas as formas de opressão sobre o Homem, luta contra o terror, a miséria, o sectarismo e a ignorância, combate a corrupção e enaltece o mérito”  ? Quereis um melhor porquê para sermos Maçons ?!!!!
Mas para que estes “porquês” não sejam meras declarações de intenção, importa que assumamos uma atitude com eles consequente, um como fazer que traduza o facto de sermos Maçons, reflectindo-se na nossa conduta em cada dia, junto à Família, aos amigos, na sociedade em geral e até no âmbito profissional. Um Maçom deve ter, se quiser ser coerente, um comportamento irrepreensível, preocupado com a ética, a dignidade humana, a Liberdade de espírito e a autonomia individual. Enfim, deve ser um cidadão «exemplar».

De facto, a condição de Maçom só confere deveres. O primeiro dos quais é trabalhar, sem cessar, o seu eu interior, para renascer de novo (como lhe é proposto na Iniciação), levando-o a corrigir-se de forma a construir o seu próprio edifício,  cumprindo com rigor as suas obrigações para com a Ordem, para com a Loja e para com os seus IIr.’.
E se queremos persistir na tradição Maçónica, teremos de procurar conhecer o mundo e o meio em que nos inserimos, a cultura dominante, o desenvolvimento tecnológico, as dinâmicas sociais e políticas.
A Maçonaria é uma instituição tradicional e conservadora, alicerçada em sólidos princípios e tradições. E tem no seu horizonte um desafio importante, que é o de conviver com as mudanças trazidas pela globalização económica e financeira e pelo desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação. O Desafio é de como lidar com a modernidade sem abrir mão de seus princípios e propósitos. 
Isso significa que saber divulgar fora do Templo as verdades nele adquiridas, é também um outro dever fundamental em que temos de persistir, porque também entre nós se têm sentido os efeitos de vivermos numa “aldeia global”, em que a Maçonaria deixou de ser “secreta” para passar a ser “discreta” e sobre ela está à disposição pública uma ampla informação, através dos meios tradicionais (livros, imprensa, rádio e televisão) e sobretudo através da Internet onde podemos aceder a sites sobre Maçonaria, artigos, blogs e até livros online, tratando de todos os temas, alguns com muito discutível credibilidade e qualidade e outros com o claro propósito de nos caluniar e descredibilizar. Nuns casos, usando a mentira descarada, noutros explorando o mau comportamento de alguns ditos Maçons.
A melhor forma de divulgarmos os nossos princípios e objectivos é através do exemplo. Do que somos dentro da maçonaria e, sobretudo, do que somos no mundo profano.
Os péssimos exemplos de pessoas como os brasileiros Michel Temer ou Edir Macedo (IURD) e a denuncia do que se passa em Obediências que albergam núcleos criados sobretudo para favorecer carreiras e negócios pessoais, enlameiam a Maçonaria e o nosso GOL. Mas também no GOL não se pode permitir a presença, e muito menos a elevação(!), de quem não está ética e moralmente de acordo com os nossos princípios. De quem usa o avental apenas como instrumento de poder ou proveito próprio.
É nosso dever estudar e conhecer este mundo que vive um período muito conturbado e contraditório, procurando adaptar-se às consequências das enormes mudanças decorrentes da globalização e do rapidíssimo desenvolvimento das tecnologias de informação e comunicação em que esta se suporta. E penso ser nosso dever a defesa de uma atitude pro-activa perante as profundas mudanças que nele se vêm verificando.
Como refere o nosso Ir.’. Salvador Allende numa sua prancha de Julho de 2019, “A luta pelas esferas de influência das grandes potências, em busca de fontes de matérias primas essenciais às novas tecnologias, a par do sempre presente petróleo, aliadas ao papel hegemónico da financeirização global da economia, criaram as condições propícias aos conflitos regionais, que têm descambado em guerras terríveis, impondo às populações enormes sacrifícios e perdas irreparáveis, que acabam por ser potenciadas pelo extremismo religioso (principalmente de raiz árabe sunita ou xiita),  sendo as guerras na Síria, Iraque, Líbia , Iémen, Palestina, etc, os seus expoentes mais devastadores.
O escape natural nos países e áreas mais atingidas por estas flagelações e sofrimento indescritíveis, traduziu-se no exacerbar dos extremismos contra os valores ditos ocidentais, na reforço da fuga para a prática de  religiões ou crenças totalitárias, cadinho em que floresceu e se desenvolveu a violência e o terrorismo sem pátria, que actualmente ameaça os valores e a segurança das sociedades mais livres e desenvolvidas do mundo ocidental, precisamente aquelas em que a Maçonaria historicamente mais se desenvolveu  (mas a que também não escapam a África e a Ásia)” .
De facto, se por um lado podemos dizer que a globalização contribuiu para tirar da miséria cerca de 700 milhões de seres humanos (sobretudo na China, Índia e América do Sul) e o desenvolvimento tecnológico veio permitir um muito mais rápido crescimento económico, por outro lado agravaram-se as desigualdades entre ricos e pobres – tanto pessoas como países.
O combate às desigualdades é, sem dúvida, a par com as alterações climáticas, um dos mais importantes temas de debate actual (voltarei ao assunto, de forma mais detalhada, em futura prancha). Nas últimas décadas, a "desigualdade", sobretudo nos países mais desenvolvidos, atingiu níveis idênticos aos verificados antes da Grande Depressão de 1929, com a concentração de 80% da riqueza mundial em menos de 10% da população do planeta (no final de 2018, o número de bilionários tinha duplicado em relação a 2008 e os 26 mais ricos detinham tantos rendimentos como os 3.800 milhões da metade mais pobre da humanidade!) .

E isto, temos de concordar, é um insano contrassenso se tivermos em conta os enormes avanços civilizacionais, técnicos, científicos e comunicacionais verificados nos últimos 90 anos!
E aqui chegado, não resisto a citar um breve trecho da mais recente prancha do nosso Ir.’. Isaac Newton. Dizia ele:
“Deixemo-nos de adivinhações, concentremo-nos nos nossos valores imortais e aprendamos a difundi-los hoje, porque as sociedades do amanhã serão como as de hoje, só que com menos fios, mais idiotas (a percentagem sobre o total tende a manter-se) ainda mais ecrãs, e com derivados de torradeiras armados em espertos.
Sempre atentos, informados, fazendo escola da sensatez e da prudência, poderemos ir ajudando a corrigir, passo a passo, a evolução que estamos a enfrentar, ou seja, sempre fiéis aos nossos princípios originais e perenes,  conseguiremos contribuir seriamente para promover a esperança, desempenhando assim um papel importante no futuro como já fizemos no passado”.
E nós, que entendemos ser a Maçonaria “uma Ordem universal, filosófica e progressiva, fundada na Tradição iniciática, obedecendo aos princípios da Fraternidade e da Tolerância, e constituindo uma aliança de homens livres e de bons costumes, de todas as raças, nacionalidades e crenças” , temos pois pela frente um imenso trabalho e um duro combate, para defender os princípios e valores Maç.’. que nos unem e animam.

Cândido, M.’.M.’.







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