"A casa de Diógenes", Jean-Léon Gérôme_ 1860 |
Por ter sido acusado de falsificar a moeda local foi expulso da sua cidade Natal tendo escolhido Atenas para viver.
Foi um dos expoentes máximos de uma das Escolas Menores Pós-Socráticas (a Escola Cínica) fundada por Antístenes de quem foi discípulo apesar de este o ter rejeitado na primeira tentativa de aproximação daquele.
O nome desta Escola não tem uma origem precisa pois sugerem-se duas hipóteses:
1. deriva de um ginásio situado próximo de Atenas, o Cinosargo, onde Antístenes, o seu fundador, ensinava ou 2. derivada da palavra grega Kyon que significa cão.
A Semântica, com o tempo, alargou o significado da palavra «cínico» dando-lhe uma conotação actual que nada tem a haver com a antiga.
A Escola Cínica_ Os seguidores de Sócrates que não atingiram projecção, quer na Academia de Platão quer no Liceu de Aristóteles, juntaram-se em Escolas que foram denominadas como Escolas Menores Pós-Socráticas (Cirenaica, Megárica, Ilíaca e Cínica).
A Escola Cínica foi fundada por Antístenes de Atenas discípulo de Górgias e depois de Sócrates. Cultivaram a princípio a Ética Socrática mas desviaram-se para um exagero de desapego à Civilização. Desejavam um retorno à vida mais primitiva e mais próximo da natureza.
O Cinismo era definido como «um atalho para a virtude» em oposição à cultura erudita que requeria muito tempo de aprendizagem e saber. Este atalho, contudo, era um método muito rigoroso (askésis) que exigia exercício, prática, treino e disciplina.
Começaram por praticar a perseverança e a resistência e substituíram a mediação conceptual pelo exemplo e pela acção. O exercício e a fadiga eram capazes de habituar o homem a dominar os prazeres visto que são estes a amolecer o físico e o espírito pondo em perigo a liberdade.
Na liberdade da palavra (parresía) atingiram os limites da desfaçatez e da inconveniência e na liberdade da acção (anaídeia) se encontravam para com auto-controle, auto-suficiência e impaciência alcançarem «o bastar-se a si mesmo (autárkeia)».
Para eles os verdadeiros adversários existenciais eram o exílio, a pobreza de espírito, a fome e a morte usando a franqueza, a liberdade do discurso e o riso para os enfrentar.
Tinham como guias a Humildade, Frugalidade e Integridade.
Vida e Obra_ Diógenes de Sínope não deixou nada escrito e o que se sabe sobre a sua Filosofia foi-nos fornecido pelo doxógrafo romano do Século III d.C. chamado Diógenes Laertius. O legado foi mais de acções do que de textos de acordo, aliás, com uma das principais características da Escola Cínica (anaídeia) em que se dá primazia à prática e reservando o discurso (parresía) a máximas recheadas de ironia e anedotas.
Considerava-se um «Cidadão do Mundo», vivendo na rua num tonel (semi-aberto transversalmente) rodeado de cães, vestindo uma túnica, sacola a tiracolo e as mãos seguravam um cajado e uma lanterna.
Desprezava por completo as convenções sociais, a riqueza material e a corrupção.
A sua opção pela extrema pobreza não era senão a aplicação prática para demonstrar que era possível acabar com as convenções sociais alcançando assim a auto-suficiência (autárkeia).
Agia para obter a felicidade da maneira mais simples e económica seguindo o que a natureza honrosamente lhe fornecia, vestia-se com uma simples túnica e satisfazia as suas necessidades básicas (comer, dormir, dançar, dialogar, etc.) ao ar livre ficando para a história algumas acções célebres que descreverei brevemente:
1. quando preso por piratas foi vendido como escravo e à pessoa que o comprou disse «sou teu escravo mas tens que me obedecer se quiseres aprender a ser bom e culto».
2. perguntaram-lhe um dia porque lhe chamavam cão e a resposta foi «balanço a cauda alegremente a quem me dá qualquer coisa, ladro aos que não dão e mordo os patifes».
3. afirmava que a maneira mais correcta de o homem viver consistia em ter as necessidades mais simples possíveis (« para o homem basta-lhe a vida e na vida precisamos de razão ou uma corda para nos enforcarmos»), pois tudo o que é natural é respeitável e decente.
4. quando tinha fome deitava-se no chão esfregando a barriga e dizendo «como seria bom se pudéssemos aplacar a fome esfregando o estômago».
5. definia o prazer em dois grupos: os que são comuns à natureza e os que se baseiam em convenções sociais e políticas e, portanto, não naturais.
6. ao perguntarem-lhe porque andava sozinho respondia «porque vocês são demasiado importantes para a minha subtileza e eu sou demasiado subtil para a vossa importância».
7. afirmava que não era a vida que era má mas sim a maneira como se vivia («para que serve viver se não viveres bem»).
8. quando convidado por um homem rico para um banquete foi advertido que não cuspisse no chão, então, Diógenes fê-lo para o anfitrião dizendo que «na casa de um homem rico o melhor sítio para cuspir seria a face do referido».
9. perguntaram-lhe porque se davam esmolas a um pedinte e não a um filósofo? Respondeu-lhes «porque os que dão pensam que um dia poderão ser cegos ou aleijados mas nunca pensam que serão filósofos».
10. um dia, Alexandre o Grande (que morreu no mesmo dia que Diógenes na Babilónia) interpelou Diógenes quando este apanhava Sol na sua casa improvisada (o tonel) perguntando se ele, o grande Alexandre, poderia dar-lhe o que o filósofo queria ao que este respondeu «não me tires o que me não podes dar, sai da frente do meu Sol que me estás a provocar sombra».
11. à pergunta sobre o que achava dos grandes proprietários respondia que «entre estes e os pobres de espírito havia uma distância mínima, pois uns e outros, em vez de acreditarem nas suas características humanas preferiam a patética dependência de artefactos e do conforto facilitado».
12. de dia e com a lanterna acesa vagueava dizendo «procuro o homem genuíno que sabe reencontrar-se com a natureza».
Em resumo, Diógenes de Sínope foi um Filósofo praticando a liberdade em vez da frasear, auto-controlado, auto-suficiente, impaciente com a hierarquia social, procurando a verdade em vez do prazer fácil, instigando e ensinando os processos naturais e, sobretudo, resistente e impassível ao lado incorrecto da humanidade.
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