Com a devida Vénia e repectiva autorização se transcreve esta reflexão do João Soares
A Loja Maçónica como espaço de coexistência entre crentes,
agnósticos e ateus
Uma reflexão sobre a sua coexistência
Como abordar o tema? Numa sistemática comparação socorrendo-nos a uma disputa proporcionada pelo argumentário filosófico e científico das diferentes formas de se estar, ou identificando a plataforma comum de coexistência proporcionada pelos valores subjacentes que a nossa vivência Maç nos oferece?
A segunda opção arrasta consigo os alicerces que nos unem, seguramente, mas ficará manca e desprezaria toda a riqueza do pensamento e reflexão filosófica humana se por aqui ficássemos. Aliás, será destas diferentes formas de se estar, intimamente ligadas à nossa natureza e diversidade biológica que emanará a riqueza colectiva da humanidade.
Por norma a consequência, diz-nos todo o processo histórico, não é este, mas o seu contrário: lutas fratricidas, processos bélicos, divisões e a consequente intolerância, ausência de fraternidade, de esperança e de caridade, só para citar alguns dos nossos azimutes valorativos.
Assim sendo, talvez o propósito da nossa vivência Maç seja este mesmo, isto é, não menosprezar a dialéctica associada à temática, mas sim, promovendo-a e, de forma inteligentemente modulada tentarmos chegar a corolários, não disruptivos, mas agregadores.
Tarefa aparentemente difícil se reduzirmos esta reflexão a um campo de batalha argumentativa onde o dogma e a sua aceitação ou o seu repudio sorva toda a riqueza da reflexão filosófica.
Tentemos, portanto, contrariar esta propensão e descerremos o nosso espírito e potencial intelectual à globalidade do assunto em apreço. É isto que nos propomos nesta reflexão. Comecemos então pela nossa natureza já que ela nos ilumina e abre mundos no potencial que encerra, mas que também nos limita à realidade biológica a que estamos agrilhoados. E reforço a ideia de acorrentados já que, na perspectiva original cartesiana que nos ofereceu o método científico, tudo para além do resultado das interacções neuronais dificilmente tem espaço na dialéctica, a arte de raciocinar com método. Ficamos, portanto, vedados fechando todas as portas à consideração de realidades para além desta limitação biológica, ou seja, nesta perspectiva, o homem dificilmente se poderá sublimar para além da sua natureza embora encontremos inúmeros exemplos desta tentativa nas artes, na literatura e na poesia quase como que em grito desesperante de libertação da sua limitação biológica.
Isto para dizer que na actualidade um dos limites do conhecimento humano se encontra na mente humana. O outro encontra-se na física teórica, mas quanto a este lá chegaremos.
Duas fronteiras que não podem ser menosprezadas nesta reflexão, ainda que o tema possa evoluir espontaneamente para a temática do transumanismo; mas isto seria outra discussão ainda que e seguramente necessária de se ter. Voltemos à nossa natureza, à nossa biologia e como referido, ao limite do conhecimento nesta área, o cérebro, a mente e a consciência numa abordagem epistemológica já que a ciência é um produto da mente humana e tenta dar esta explicação.
Esta reflexão para ser séria carece de rigor semântico, já que sem ele abrimos uma potencial vereda à discórdia estéril pelo que, alinhemos os nossos entendimentos relativamente ao cérebro, à mente e à consciência. Cérebro, estrutura biológica parte integrante do encéfalo cujo elemento básico estrutural é o neurónio. Este tecido biológico não é autónomo, já que requer os necessários substratos á sua existência designadamente, que o sistema vascular proporcione o necessário aporte de oxigénio ao seu funcionamento. Temos, portanto, uma definição cartesiana que é suficiente para o explicar, não havendo a necessidade de mais e elaboradas reflexões de natureza filosófica.
Mente, muitas vezes tido como significado de cognição. Por outras palavras, o produto funcional da actividade cerebral na sua dimensão de raciocínio e reflexão.
Consciência, componente da mente a que se atribui o potencial de subjectividade e autoconsciência. Sem ela simplesmente não existiríamos enquanto homo sapiens sapiens e seriamos remetidos para outros patamares da evolução biológica. Tal como a mente, também a consciência requer um suporte físico para existir e, neste caso em apreço algo que, aparentemente não sendo a única resposta, é produto de milhares de anos de evolução biológica dos sistemas neuronais. A este propósito cito António Damásio:
“É um quase paradoxo que, ao pensarmos no tempo da vida humana no planeta, apenas
no último quarto desses quatro biliões de anos se deu a entrada dentro do sistema nervoso
e que só nos últimos 200 milhões de anos é que, quando muito, há qualquer coisa que
venha a parecer-se com aquilo que é o nosso sistema nervoso. A conclusão é que grande
parte do tempo dos seres vivos sobre o nosso planeta tem sido vivida de uma forma
inconsciente.”
Entrevista In DN, 5 de Dezembro de 2020
No que a esta reflexão importa, a corrente maioritária defenda que a consciência é um fenómeno bioquímico, pois, para haver consciência é necessário cérebro, no entanto há aqueles que defendem que a consciência não seja um atributo da matéria. Talvez esta abordagem nos ajude a compreender com a aproximação mais científica que conseguirmos porque alguns de nós aceitam o dogma.
Dissemos que aparentemente a evolução neurológica seria a única forma de consubstanciar a consciência, no entanto, e recordo estarmos a navegar na fronteira da ciência e do conhecimento, a própria ciência está a abrir-nos a porta a alternativas num território que até à pouco era propriedade da ficção científica. Refiro-me ao WBE sigla de “whole brain emulation” ou emulação do estado mental processo tecnológico que permitirá realizar o upload da consciência, não só na informação encerrada na memória, mas sobretudo do “eu” senciente.
Foi já criado em 2014 como parte do projecto OpenWorm um conectoma completo da lombriga Caenorhabditis elegans de 1.5 mm. Possui apenas 302 neurónios e cerca de 7,000 conexões sinápticas. O seu cérebro foi replicado como um software e instalado em um robô Lego que se movia como um verme.
Daqui até aos 86 biliões de neurónios que funcionam simultaneamente em uma grande rede e os mais de 125 triliões de sinapses apenas no córtex cerebral do ser humano, a concretização deste desiderato terá a sua resposta na intersecção da linha que nos é dada pelas leis de Moore, para não trazer à discussão o potencial incomensurável dos futuros computadores quânticos já em processo de desenvolvimento.
Por outras palavras, não está a ciência ainda capacitada a caracterizar, para não dizer mesmo definir, o que se entende por consciência permanecendo, portanto, aberta a porta para aproximações de outra natureza designadamente a filosófica. Acresce que, a própria ciência admite já, e está a encetar esforços tecnológicos no sentido de se realizar o dito upload da consciência para suportes ainda que físicos, distintos do tecido cerebral. Tentemos imaginar um computador encerrando toda a informação da memória de um ser humano, tendo consciência de si mesmo logo, equipado com o potencial de criação intelectual. O computador, isto é o hardware, é seguramente explicado pela ciência, já o software poderá ou não ter explicação pelo método científico, reforçando assim a anterior ideia de que as alternativas intelectuais supra ciência continuam a ter o seu espaço.
Recentramo-nos no tema inicial e na outra fronteira da ciência atrás apontada, a física teórica, disciplina intelectual humana que coexiste em permanente sobreposição com a filosofia.
Em concreto, dois temas encontram-se na vanguarda desta disciplina, a compreensão da origem do universo e a natureza dos buracos negros. Segundo o físico italiano Carlo Rovelli, no seu livro “A realidade não é o que parece”, a teoria da gravidade quântica em loop reconhece que precisamos mudar nossa noção de tempo e espaço para entender a física dos primórdios do Universo e do interior dos buracos negros. Ou seja, os conceitos de tempo e espaço simplesmente não existem para esta teoria. Esta é uma das abordagens na demanda da física para atingir o seu graal, a “Teoria de tudo” onde as existentes teorias parciais, empiricamente comprovadas, das forças da gravidade, força forte e força fraca se fundirão em simbiose.
Outro conceito disruptivo para as nossas mentes, o enquadramento que temos do que consideramos ser a realidade, é o da sobreposição quântica. Estamos agora no domínio da física empírica e não da teórica uma vez que já foi laboratorialmente identificada a existência de uma mesma partícula, neste caso moléculas de considerável dimensão, em dois pontos distintos do espaço simultaneamente.
Desde logo deixar nota do impacto deste achado nos alicerces lógicos do pensamento, concretamente nos seus princípios, o da não contradição e do terceiro excluído que norteou todo o nosso raciocínio de Parmênides de Eléia à actualidade acabando por se tornar na pedra angular do método científico.
Falámos de biologia e chegámos à consciência e sua potencial autossuficiência existencial, e falámos de física e chegámos aos actuais paradoxos que norteiam a investigação de ponta na ciência, ambos os temas colocando em questão a nossa mais profunda compreensão da realidade e, outros exemplos poderiam ser apontados. Chegámos a este ponto usando apenas uma ferramenta: a ciência e o seu método. Fomos por esta via arrastados para os paradoxos descritos, embora não seja isto que esperaríamos da aplicação do método científico.
Neste exercício intelectual que é a ciência temos como seguro e imutável as leis que dela emanam, mas, até estas são desafiadas pela sua própria evolução, que nos transportam à sua fronteira, a do entendimento da realidade abalando a nossa vaca sagrada do racionalismo científico.
Não nos socorremos da filosofia nem da crença, pelo que, para que a presente reflexão, como atrás se disse, não fique manca deverá agora aventurar-se no terreno da filosofia e progredir nesta vereda do conhecimento.
Desde logo Galileu Galilei considerado o pai da moderna ciência com os seus achados experimentais e posteriormente Descartes ao defender uma nova visão da natureza entregaram-nos o método científico como disciplina intelectual humana práctica e não especulativa e deram-nos os alicerces da ciência, em uso até aos nossos tempos.
Isaac Newton pela aplicação do método científico deu-nos as tais leis, sendo a mais conhecida a da atração dos corpos expressa na lei da gravidade. Pois também esta vaca sagrada, ainda que limitada ao mundo macroscópico, já é ela também questionada ou pelo menos completada com a descoberta de uma partícula subatómica responsável pelas propriedades gravitacionais da matéria, o bosão de Higgs.
A propósito desta descoberta será interessante deixar nota do baptismo dado pelos físicos investigadores, a esta partícula cuja existência ainda apenas se teorizava, como a “partícula de Deus” numa perspectiva de, num ponto futuro de apanágio utópico a ciência se unir a Deus. Ideia a explorar sem dúvida, lá chegaremos.
Outra vaca sagrada da ciência é a teoria evolucionista legada pelo naturalista Charles Darwin na sua obra “A origem das espécies”. É do conhecimento comum o que ela defende, a ancestralidade comum e a selecção natural, afirmando este naturalista que o processo evolucionista será sempre lento e gradual. Nada a opor até porque, há uma miríade de exemplos que existem a confirmar a sua tese, para não falar na progressão desta teoria para o neodarwinismo apoiado nos mais recentes desenvolvimentos da genética. Todas as críticas que surgiram e se mantêm tiveram e têm como substrato o dogma religioso logo, agravadas pela existência de filtros e interpretes humanos entre a palavra de Deus e o os actores deste debate.
No que a nós nos toca, não será difícil concluir que a teoria evolucionista nos poderá rotular de contranatura. Uma interessante explicação é dada no livro “O gene egoísta” do zoólogo Clinton Richard Dawkins, onde o autor afirma na página 39 da sua obra que “…a ideia de que uma qualidade predominante que se pode esperar de um gene bem-sucedido é o egoísmo implacável. Em geral o egoísmo do gene originará um comportamento individual egoísta. No entanto, existem circunstâncias especiais em que um gene pode atingir mais efectivamente seus próprios objectivos egoístas cultivando uma forma limitada de altruísmo, que se manifesta no nível do comportamento individual”.
Apesar de refutada pelo paleontólogo norte-americano Stephen Jay Gould, onde este suporta a sua critica no facto de “…a selecção natural só pode produzir a adaptação a ambientes imediatamente próximos e em mudança” o certo é que parece existir para nós uma réstia de esperança com a actual descoberta dos genes espelho tal como descritos pelo pesquisador da Universidade da Califórnia em Los Angeles Marco Iacoboni:
“…São pequenas estruturas neurológicas que entram em actividade quando se executa e quando se observa uma ação em curso. Essas células são de extrema importância para a mente humana e já foram comparadas ao ADN em termos de relevância científica. Os primeiros estudos psicológicos partiam da ideia de que uma mente solitária encara o mundo de forma isolada. Os neurónios-espelhos dão-nos outra narrativa com sustentação científica. Eles dizem que, literalmente, estamos na mente das outras pessoas…”.
Esta descoberta está já a proporcionar à comunidade científica vias alternativas de investigação em distúrbios do foro neurológico caracterizados por transtornos sociais como é o caso da esquizofrenia e do autismo. Esta descoberta permite-nos extrapolar com esperança de que este desenvolvimento científico nos possa conduzir a uma identificação no futuro do gene da Fraternidade.
Por outras palavras, passamos de ser aparentemente contranatura na interpretação evolucionista para voltarmos a estar no caminho correcto e em perfeito enquadramento com a nossa biologia.
Já o projecto do genoma humano que consistiu no mapeamento do ADN humano através de múltiplos centros de investigação (Alemanha, Austrália, Brasil, Canadá, China, Coreia, Dinamarca, Estados Unidos, França, Holanda, Israel, Itália, Japão, México, Reino Unido, Rússia, Suécia e outros), comprovou que 97% das sequências não codificadas do material genético humano correspondem a heranças genética de proveniência desconhecida a que apelidaram de “junk DNA” abrindo deste modo novamente as portas às teorias da panspermia.
O que se pretende com os anteriores exemplos é o de encontrar elementos que nos permitam formular as seguintes perguntas:
São as leis científicas perenes como seria expectável pela aplicação do método científico? E, com que certeza podemos produzir afirmações de natureza perene? Seguramente que o racionalismo científico irá argumentar com a própria natureza dinâmica da ciência que, encerra em si mesma o potencial de autocritica e consequente evolução e aproximação à realidade.
Nada a opor, inclusivamente é atractiva esta ideia de dinamismo autocritico que existe no método, mas que limita a segurança de obtermos verdades perenes e universais. Assim, tal só acontecerá no limite do conhecimento, isto é, quando a ciência tudo explicar encerrando-se em si própria.
Voltemos ao assunto primeiro, a coexistência entre ateus, agnósticos e crentes. Pareceme termos atingido uma interessante interseção entre todos: para uns, a aceitação à priori do conceito divino com o consequente substrato dogmático, para outros a aceitação do conhecimento absoluto tendo por dogma intuitivo ou dedutivo a ciência e o seu método.
Não somos assim tão diferentes uns dos outros.
Como MMaç tornarmo-nos nos paladinos da luta contra a instabilidade e fragilidade da natureza humana que, através do estudo da natureza nas suas abordagens aparentemente dualistas, a cientifica e a filosófica se constitui num mediador privilegiado entre os homens e Deus, seja ele o que nos foi revelado, aquele construído pelo nosso intelecto, ou ainda aceite como o paradigma utópico do conhecimento absoluto.
Da nossa experiência enquanto MMaç e, tentando extrair o âmago dos inerentes ensinamentos, aparentemente mantem-se a questão que está implicitamente encerrada no título desta reflexão: O espaço em Loj, ateus, agnósticos e crentes, é possível a sua coexistência?
Tentemos à laia de conclusão abrir o caminho a uma possível resposta que seja intelectualmente aceitável e se enquadre na nossa realidade de maçons que trabalham numa Loj Maç.
Desde logo a primeira questão, e que apenas os irmãos ateus poderão responder, prende se com o substrato religioso de extracção bíblica e demais textos religiosos, em que se inspiram todos os graus apresentados para alcançarem os seus ensinamentos. Como vivenciam estes irmãos a dimensão espiritual do rito? Atrevamo-nos a uma explicação: ainda que ateus, o que somos hoje é produto da cultura em que crescemos, da educação que nos foi proporcionada ou por nós selecionada, das opções que fizemos nos nossos percursos de vida.
A libertação dos grilhões culturais e educacionais em que vivemos toda a nossa vida será porventura o exercício intelectual mais desafiante da nossa existência e, ainda que através de uma leitura metafórica do rito em geral e os graus indicados em particular, pode esta leitura fornecer uma plataforma intelectual onde extrapolações de natureza filosófica serão seguramente aproveitadas com a necessária utilidade em prol da humanidade, pelas mentes convenientemente preparadas para o fazer.
Quanto ao dogma presente em todos os textos iniciáticos, como os considerar? Deverão também eles serem interpretados na mesma perspectiva alegórica, seguramente. Tenho um bom exemplo a partilhar de uma discussão com um ateu a este propósito. Este irmão quando confrontado com o juramento que fez sobre a Bíblia, socorreu-se da semântica para resolver o assunto atribuindo o único significado aceitável pelo seu espírito para a palavra Bíblia que foi o sinónimo de pergaminho, aliás, etimologicamente justificado e, jurar sobre um pergaminho tem uma dimensão ritualística e filosófica que não ferem as suas convicções, assim o disse assim o justificou. É uma via perfeitamente aceitável de convivência com o ritual, no entanto, na minha muito humilde e prosaica opinião, redutora e limitadora da matéria-prima necessária ao exercício de global introspeção tão necessária nestas matérias. Como atrás se referiu e aqui se recorda, tenho que a ciência e o seu método encerram em si o seu próprio dogma já que aspiram, num momento a acontecer, enclausurar em si a explicação de tudo. Por isso, e de forma provocativa não vejo muita diferença entre um ateu e um crente no que concerne à aceitação de dogmas.
Quanto aos crentes, o desafio que se lhes coloca, isto na senda da dita anterior opinião pessoal humilde e prosaica, é o de compreender se a aceitação do dogma é resultado de um processo intelectual de natureza reflexiva e filosófica e, porque não dizer também com eventual substrato científico, ou o resultado de um incomensurável peso cultural ainda que oculto na dimensão subconsciente da mente. Temos exemplos múltiplos de cientistas de renome, ateus e também outros crentes e que nos poderão seguramente ajudar neste desafio intelectual.
De notar que ainda não houve uma referência aos agnósticos já que, tendo esta reflexão se situado nos extremos aparentemente opostos destas perceções, os agnósticos muito comodamente se situam no meio. Também para estes importa entender se esta sua opção é o resultado de um comodismo intelectual, dificilmente assumido, ou fruto também de profunda reflexão filosófica.
O argumento de que se socorre o agnóstico, neste caso o agnóstico empírico, ao não aceitar o dogma porque a ciência ainda não progrediu ao ponto de lhe dar as necessárias explicações em falta remete-o automaticamente para a atitude do ateu, neste caso envergonhado.
Aparentemente a opção mais simples de abordar, a do agnóstico, torna-se após alguns passos de reflexão, talvez na mais complexa. Desde a sua provável origem filosófica no ceticismo encerrado no pirronismo da escola de Pirro de Élis (c. 360 a.C. - 270 a.C.) e passando pelo seu batismo pelo biólogo evolucionista Thomas Huxley de agnosticismo, o facto é que para melhor se compreender esta opção foi necessário segmentá-la em diferentes definições, o agnosticismo teísta, ateísta, forte, empírico, apático, modelar e ainda o ignosticismo (consultar anexo).
Permitam-me terminar pessoalizando esta reflexão. Dentro destas classificações o ignosticista é aquele que abre as portas ao diálogo e coexistência sincera e plena entre irmãos crentes e ateus no mesmo espaço maçónico; é esta a minha opção e tenho vivido bem com ela.
Termino dizendo que não se pretendia com esta reflexão alcançar uma resposta à questão, antes, promover o debate e catalisar reflexões posteriores sendo certo que, se a abordagem colectiva deste tema é factor de riqueza, as opções tomadas estarão circunscritas ao domínio individual da reflexão intelectual onde o percurso iniciático constitui uma dimensão complementar e auxiliar ímpar.
Permitam-me terminar, como Saramaguista inveterado que sou, com uma frase deste universal autor:
“…o céu é o resplendor que há dentro da cabeça dos homens, se não é a cabeça dos homens o próprio e único céu.”
In Memorial do Convento
João Soares MM, Ob da RLoj Acácia
Posfácio
O presente texto é o resultado de uma reflexão, como indicado no subtítulo, executada ao correr da pena. Desta forma, não houve a preocupação de dotar o texto de referências bibliográficas já que não se procedeu a nenhuma transcrição de texto com exceção das citações que estão devidamente identificadas no mesmo.
As obras referidas na sinopse bibliográfica identificam livros cujos conteúdos e leitura capacitaram o autor da presente reflexão com informação sem a qual os conteúdos não teriam sido possíveis da forma como são apresentados e que foram consultadas retrospetivamente durante a presente redação na perspética de se verificarem as afirmações que se fazem.
O autor apesar de não seguir o acordo ortográfico, no entanto, vê-se limitado na sua opção tecnológica de revisão do texto, razão pela qual se encontrará o texto de acordo com o referido acordo ortográfico.
Por fim, não foi pretensão do autor proporcionar uma resposta à pergunta inicialmente colocada antes, promover a discussão apresentando temas e argumentos que lhe pareceram úteis na catalise desta reflexão que bem poderia ter sido alternativamente realizada em amena conversa de tertúlia.
Bibliografia:
“A origem das espécies”, Darwin, Charles, Lisboa, Verbo, 2011
“A realidade não é o que parece”, Rovelli, Carlo, Lisboa, 11x17, 2022
“O erro de Descartes”, Damásio, António, Lisboa, Temas e Debates, 2011
“Sentir & Saber - A Caminho da Consciência”, Damásio, António, Lisboa, Temas e Debates, 2020
“O gene egoísta”, Dawkins, Clinton, Lisboa, Gradiva, coleção ciência aberta, 2010
“A consciência na perspectiva de Antônio Damásio: self e subjetividade”, Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Instituto
de Filosofia da Universidade Federal de Uberlândia (IFILO/UFU) como requisito à obtenção de título de Bacharel em Filosofia,
Uberlândia, 2 de dezembro de 2019 Camila Cristina de Oliveira Lopes
“Neuroinformatics: An Overview of the Human Brain Project” (Progress in Neuroinformatics Research Series) 1st Edition,
Stephen H. Koslow (Editor), Michael F. Huerta (Editor)
“Science and Religion: A Very Short Introduction.” Dixon, Thomas (2008). Oxford: Oxford University Press.
“The Demon-haunted World: Science as a Candle in the Dark.”, Sagan, Carl (1997), ISBN 9780345409461
Anexo – Diferentes classes de agnosticismo
Agnosticismo teísta - Vertente voltada especificamente para a questão sobre a existência
de divindades, engloba tanto o teísmo, quanto o agnosticismo. Um agnóstico teísta
acredita na existência de pelo menos uma divindade, mas diz respeito à base desta
proposição como "algo desconhecido ou inerentemente incognoscível".[carece de fontes]
Agnosticismo ateísta - Também voltada para a questão da existência de divindades,
engloba o ateísmo e o agnosticismo. Ateus agnósticos entendem que o conhecimento
sobre a existência de uma divindade ou é incognoscível, ou ainda é desconhecida, porém
manifestam opinião pessoal de não acreditar na existência de divindades.[8]
Agnosticismo forte - É o estilo de agnosticismo adequado às dúvidas que não podem ser
respondidas, independentemente de quantas provas coletemos, uma vez que a própria
ideia de “prova” não pode ser aplicada. A dúvida existe em uma dimensão além da que
as provas podem alcançar. Agnósticos fortes quanto à existência de divindades defendem,
portanto, a ideia de que a compreensão ou conhecimento sobre deuses ou o sobrenatural
se encontra - e sempre se encontrará - completamente fora das possibilidades humanas.
Agnósticos permanentes por princípio não manifestam uma opinião pessoal quanto à
existência ou não do sobrenatural.
Agnosticismo empírico - A ideia de que a compreensão e conhecimento do divino ou
sobrenatural não é, até ao momento, possível. Admite a possibilidade do aparecimento de
novas evidências e provas sobre o assunto.
Agnosticismo apático - a ideia de que, apesar da impossibilidade de provar a existência
ou inexistência de deuses ou sobrenatural, a existência destes não teria qualquer influência
negativa ou positiva na vida das pessoas, na Terra ou no Universo em geral.
Ignosticismo - Embora se questione a compatibilidade deste grupo com o agnosticismo
ou ateísmo, há quem o considere como um grupo agnóstico. Esse grupo baseia-se no fato
de que primeiramente é preciso definir Deus, para apenas posteriormente discutir sua
existência. Para cada definição de Deus, pode haver uma discussão diferente e diferentes
grupos de ateus, teístas e agnósticos referentes àquela definição particular
Agnosticismo modelar — Ideia de que questões metafísicas e/ou filosóficas não podem
ser verificadas nem validadas, mas que um modelo maleável pode ser criado com base no
pensamento racional. Esta vertente agnóstica não se dedica à questão da existência ou não
de divindades.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Agnosticismo
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