Fiquem vocês sabendo que, muito mais cedo que tarde, abrir-se-ão de novo as grandes alamedas por onde passe o homem livre, para construir uma sociedade melhor.

(Últimas declarações de Salvador Allende ao povo chileno a 11 de Setembro de 1973, quando os aviões dos generais fascistas já bombardeavam o Palácio de La Moneda)

20 de fevereiro de 2020

As Diversas Influências Filosóficas que a Maçonaria Incorporou (Séc.- XVII-XVIII)


As Diversas Influências Filosóficas que a Maçonaria Incorporou
(Séc.- XVII-XVIII)

Com o crescimento das cidades durante o Renascimento, a Reforma e a Contra-Reforma e o declínio na demanda por grandes projectos de construção, os privilégios especiais dos pedreiros como artesãos viajantes desapareceram — em Portugal, a última Grande Obra (assinada) de arquitectura urbana foi o Aqueduto das Águas Livres.
Como resultado, os Pedreiros Livres começaram a receber não-pedreiros como clientes. Isso levou a que no século XVII, a um grande número de pedreiros especulativos ou não-trabalhadores entrassem nas “lojas” maçónicas. Mas os maçons mantiveram as antigas tradições, na simbologia e na geometria. É assim que ainda hoje os novos membros continuam a ser designados por ‘Aprendizes’, depois ‘Companheiros’ e finalmente ‘Mestres Maçons’. É por isso que ainda hoje se mantêm o segredo original de como se ensina a amizade, a ética, amor fraterno, a solidariedade e a verdade. E é também pelas mesma razões que se praticam as senhas e os sinais antigos. Pelo menos é nisto que os maçons acreditam relativamente ao seu passado histórico, desde o ‘Século das Luzes’.
A estrutura da Maçonaria especulativa moderna, como a que conhecemos hoje, não surgiu com a formação da primeira Grande Loja em Londres em 1717, como alguns insistem em defender — esta afirmação baseia-se tão-somente na necessidade de justificar o poder imperial britânico e colonial face à restante Europa franco-maçónica, num tempo em que a casa real dos Hanover usurpou a coroa original de Inglaterra da Casa dos Stuart em 1714. É por esta razão que a actual realeza britânica continua tão empenhada em manter a imagem e o poder, apelidado de Commonwealth e porque insistem em propagar a mentira de que a Maçonaria Especulativa Moderna foi fundado por eles.

Embora várias Grandes Lojas tenham recebido o seu alvará da Grande Loja de Inglaterra e de outras primeiras Grandes Lojas — como as que hoje existe na maioria dos países do mundo anglo-saxónico e em cada um dos Estados Unidos — elas apenas representam os trabalhos de um ‘iluminismo’ inglês, mercantil, escravocrata e usurpador, pois à revelia da própria tradição maçónico o seu Grão Mestre é invariavelmente o rei ou o príncipe. A Maçonaria em meados do século XVIII começou a espelhar dois ideais bem diferente, um monárquico e tradicionalista (protestante ou católico) e outro republicano partindo do reconhecimento do direito do homem à sua liberdade individual.
Desde a implantação da Casa de Hanover que a Grande Loja de Inglaterra começou a introduzir muitas inovações no seu ritual alienando vários membros, especialmente aqueles que haviam migrado da Irlanda. Esta terá sido uma das razões que provocou o cisma dividindo o ofício em duas grandes lojas.

É a partir deste momento que o novo rito é chamado de ‘Moderno’, enquanto aqueles que se mantiveram ligados ao ritual tradicional foram chamados de ‘Antigos’. Depois de várias tentativas deu-se a fusão dos dois em 1813. No entanto, ainda hoje vemos os efeitos do cisma nas variações de as iniciais A:.F:. & A:.M:. Algumas Grandes Lojas, como em Illinois, são intituladas A:.F:. & A:.M:., que significa Maçons Antigos e Aceitos. Outros estados usam F:. & A:.M:., pedreiros livres e aceitos, enquanto um usa apenas F:. A:. A:. M:.
Mas este é o universo das Lojas anglo-saxónicas enquanto as Lojas francesas e de Rito Escocês tiveram um percurso diferente, nos propósitos, na filosofia e na ideologia. Este é perfil que devemos ter em mente para entender o impacto que o Iluminismo teve na Maçonaria europeia.
A Reforma Protestante e a Contra-Reforma Católica representaram não apenas um desaire religioso de uma Europa em crise de identidade profunda. Alberto Dürer lamentava-se amargamente da angústia causada pela Igreja Católica na sua alma, por incutir nela (como na dos outros) uma vida sem salvação, sem liberdade. Erasmo de Roterdão, seu amigo de casa juntamente com Damião de Gois, conspiraram por uma Europa livre, crente, mas livre. Este espírito inteiramente moderno foi profundamente influenciado por Lojas protestantes de tendência rosacruciana, outras de filosofia e outras ainda das famosas academias de letras e ciências, que começaram a despontar pela Europa fora.
Temos de entender que toda a simbólica maçónica da Europa de setecentos e de oitocentos, herdou o exoterismo da grande cultura mediterrânica (egípcia, grega e romana). Os Mistérios de Osíris, de Eleusis/ Deméter, de Dionísio (o mestre que teve doze discípulos e que foi crucificado), de Orfeu, de Pitágoras, de Platão e dos Neoplatónicos e finalmente da Gnose Cristã, com Magia e a Astrologia acopladas. Estas foram as raízes nas quais os Templários como os Construtores de Catedrais se basearam para construírem o seu saber simbólico e as artes da geometria do espírito.
O Exoterismo Judaico-Cristão, tanto na Kabbala como na própria Bíblia, serviram de manuais onde se encontraram hipertextos e receitas para a geometria do Grande Arquitecto. Nada de novo neste processo, pois ele apenas continuava as tradições de outros tempos desde a Babilónia, da Pérsia e da Grécia. Trata-se, em fim, do método. E isto explica porque mudando a cultura, a civilização, as iniciações se mantém, como muito pouca alteração. Não é a geometria, ou o ritmo que muda, mas a cultura de contexto. A Maçonaria é, portanto, adaptável à cultura, ao meio, cresce com ele, evolui na idiossincrasia, mantendo a sua força no que parece invisível. que é a geometria da vida através do ritual.

Esta é a razão de encontrarmos gestos e toques, palavras e ‘olhares’ semelhantes em várias partes do mundo, entre várias culturas, que ainda hoje vivem em tempos históricos diferentes e que nunca no seu passado presente contactaram com a Maçonaria Ocidental. Esta Maçonaria Arcaica ainda sobrevive na Ásia Central, na Ásia do Sul e no Sudeste Asiático.
Mas, e a França, a Europa Continental, como ela evoluiu a partir da Época das Luzes? Se por um lado vemos uma Igreja Católica esclerosada e um grito de liberdade com a Reforma e o movimento da Rosas-cruzes de Ouro e os Martinistas, o espaço deixado aos ateus, ou pelo menos aos livres de espírito (que não é exactamente o mesmo que ateu) é inteiramente preenchido pelas Academias de Ciências (Royal Society de um lado e Academie des Beaux Lettres), onde vários Irmãos ensaiaram novas teorias, novas tecnologias e instilaram revoluções científicas.
A Maçonaria Europeia, a partir do Iluminismo, faz-se a dois tempos: o inglês e o franco-escocês; a Grande Loja de Londres (1717) versus a Grande Loja de York; o Rito Francês e Escocês e o Inglês a tentarem marcar o mundo dos homens dentro dos impérios e das colónias. Foi aliás este aspecto que marcou Portugal e o Brasil do Marquês de Pombal e foi pela mesma razão maçónica que a D. Pedro IV de Portugal e primeiro do Brasil, deu a independência à colónia. Foi em Lisboa que se levantaram colunas de lojas inglesas e um pouco mais tarde francesas, com as invasões napoleónicas.

Mas não esqueçamos que a Maçonaria alemã teve (e continua a ter) um importância enorme, embora não demos por ela, pois os seus trabalhos são mais discretos e voltados para uma Europa central e para a Rússia. A Franco-maçonaria foi sempre uma irmã de recurso estratégico nas fronteiras da Grande Alemanha, pois a França, na sua pujança republicana, impôs o respeito da República que exportou para os EUA, com o mito fundador do Templo de Salomão e mesmo dos Rosas-cruzes e Martinistas. O Deus dos franceses e escoceses sempre foi o de uma inteligência arquitectural do universo, aliás base fundamental da iniciação e do esoterismo em geral. Por isso Roma condenou a Maçonaria no séc. XVIII e a diabolizou no séc. XIX.

Roman M:.M:.


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